quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

Pirata....e o Ano Novo Vulcânico

Amigos da Pirataria Alada 

Feliz 2024 a todos🙏

Definição de Vulcão na internet :

Vulcão é uma estrutura geológica criada quando o magma, gases e partículas quentes "escapam" para a superfície. Eles ejetam altas quantidades de poeira, gases e aerossóis na atmosfera, interferindo no clima. São frequentemente considerados causadores de poluição natural.


Próximo a virada de ano , me lembrei de um festejo desse tipo que tive a oportunidade de comemorar ao lado de um vulcão ativo, na Ilha de Barren,  próxima da Índia. Foi uma  festa no mínimo ...."exótica".

Mas antes disso, a minha experiência com vulcões começa na Europa , mais especificamente na Itália (berço de vários), com o famoso "Vesúvio" , e seus estragos adjacentes .

A bordo da Nau Karima, operando um novíssimo AS 350B2 (o Seababoon) , durante uma temporada de verão europeu, depois de curtirmos várias ilhas gregas e o mar Adriático pela costa da Croácia e Servia Montenegro, estabelecemos Base em Capri próximo a costa Amalfitana , já no mar Tirreno , do outro lado da "bota". 

Nosso ponto de apoio aéreo era o Aeroporto Internazionale di Napoli, onde eu faria o transporte de proprietários e convidados entre avião e a Nau Karima. Me tornei " íntimo " da torre de Napoli tal a quantidade de vezes que fazia pousos naquele movimentado aeroporto turístico, com um pequeno helicóptero visual , interferindo no intenso tráfego de grande aviões comerciais além da grande quantidade de jatos executivos , ou seja, eu era um "estorvo" para a paz aérea no aeroporto . Some-se a isso minha inexperiência internacional de tráfego aéreo na Europa me comunicando por meio do meu inglês "macarrônico" com italianos , voando um pequeno helicóptero francês,  de matrícula das Bermudas. Era uma salada internacional no auge do verão europeu ao lado do deslumbrante vulcão Vesúvio. A cada voo eu ficava fascinado com o visual do majestoso vulcão , mesmo já tendo sobrevoado o de Stromboli na chegada ao mar Tirreno, cruzando o estreito de Messina.

Entre um proprietário e outro , resolvi dar uma de turista e fui visitar o Vesúvio e seu estrago na famosa Pompeia. Estava acompanhado do fiel escudeiro Humberto (mecânico do Seababoon) e outros tripulantes do Karima. Subimos o Vesúvio a pé por uma trilha turística apoiados por um cajado típico de "trilheiros". O cansaço e calor intenso não impediram a surpresa do visual na borda da cratera . É um visual impressionante. Na parte da tarde fomos conhecer o estrago causado por ele, a cidade histórica de Pompeia e seus cidadãos mumificados pelas cinzas expelidas pelo Vesúvio na catastrófica erupção de 79 D.C.

Depois de várias temporadas na região deslumbrante , num dos voos para buscar convidados no aeroporto de Napoli , decolei da Nau Karima e chamei a torre :

"Napoli..VP-BFL...Buon giorno...from Capoli to Napri...500 feet...15 minutes for landing instructions".

" VP-BFL ... NAPOLI..it's not Napri, it's NAPOLI....it's not Capoli, it's CAPRI....free approach and stay in the east sector of the runway next to the tower.". 

Respondeu a torre sem muita paciência.

"Sorry NAPOLI, ... I'm Brazilian flying a French helicopter of Bermuda license , speaking English in Italy....it was my fault... VP-BFL ...500 feet in orbit east of the tower ". Tentei amenizar.

"stay on stationary flight beyond the tower".

Foi a ordem que recebi em tom de impaciência. Resolvi cumprir para evitar maiores "danos". Foi o último pouso daquela temporada. Conclui que a torre de Napoli não me queria mais interferindo no tráfego aéreo dele. Depois em outra temporada nos falamos de novo , quando vindo de Roma com destino a Salerno e fui obrigado a chamar o Controle Napoli . Fomos cordiais. Ele chegou a dizer “benvenuto brasiliano”, entre uma transmissão e outra em inglês.

Outra experiência importante com os vulcões foi na Indonésia , país também repleto deles, porém um em particular chama a atenção , o “Tambora”.

De acordo com a internet :

O monte Tambora é um estratovulcão ou vulcão complexo ativo, na ilha de Sumbawa, Indonésia, com 2 722 m ou 2 850 m de altitude. A ilha de Sumbawa é flanqueada tanto ao norte como ao sul por crosta oceânica e o Tambora foi formado pelas zonas de subducção ativas sob ele.  

Voltávamos de Komodo (a ilha dos dragões de Komodo ) quando fundeamos para ver um espetáculo da natureza : o sobrevoo dos morcegos gigantes de Satonde. Foi um espetáculo indescritível de milhares de morcegos ao pôr do sol. No dia seguinte observando a majestade do monte Tambora , o meu chefe propôs um sobrevoo. Topei na mesma hora. Partimos o Seababoon e decolamos sozinhos. Ascendemos a 12 mil pés entre nuvens esparsas até visualizar a cratera do majestoso vulcão. Reduzi a velocidade e me aproximei da cratera devagar . Fomos (o chefe e eu) de uma emoção natural por sobrevoar a enorme cratera de um vulcão daquela magnitude. Pareceu a nos haver uma área praticamente plana dentro da cratera próxima a um pequeno lago , provavelmente formado por água da chuva empoçada .

“você acha que dá para pousar dentro da cratera ?”. Ouvi a proposta do chefe.

“ acho que dá, vamos testar a consistência do solo”. Respondi emocionado pela possibilidade.

Baixamos para 10 mil pés com velocidade de 40 nós. Entramos na cratera e procurei uma área mais plana para testar um pouso leve nos esquis. Não havia vento dentro da cratera. Encontrei uma área que avaliei boa para o teste . O cheiro de enxofre e o calor aumentavam a emoção. Quando reduzi a velocidade e puxei o coletivo , percebi que a aeronave não respondia ao comando de reduzir a razão de descida . Quando atingi o limite de torque soou o alarme me avisando. Levei um susto e me lembrei que estava a 10 mil pés , mesmo vendo o solo para pouso tão próximo. Imediatamente me dei conta que precisava aumentar a velocidade para obter sustentação translacional e para tanto comecei a aumentar a velocidade , com muito cuidado usando o cíclico mantendo o torque no limite . Tive que arremeter voando no grande círculo da cratera ganhando metro a metro de altitude até atingir a borda.

“o que você está fazendo?”. Perguntou o Chefe decepcionado ao meu lado.

“Estou tentando sair do vulcão. Caso contrário, se pousarmos, não vamos conseguir sair . Estamos a 10 mil pés , com ar  rarefeito , muito quente e sem vento ! “. Respondi sem tirar os olhos dos instrumentos no limite de torque.

Mantivemos silencio a bordo até cruzar a borda da cratera devagar e mergulhar no ar fresco .

“Essa foi por pouco “. Comentei aliviado.

“se não desse para decolar , a gente deixava o helicóptero lá e sairíamos a pé”. Foi o único comentário do Chefe. 

Preferi não responder pensando : “ realmente seria facílimo ...descermos 2.850 metros , de bermuda e tênis no meio da floresta da ilha de Sumbawa , na Indonésia”.

Não pousamos na cratera formada pela maior erupção já ocorrida no nosso planeta  em 1815 , segundo alguns ou a segunda maior , segundo outros especialistas no assunto , mas pousamos no Karima em segurança carregando uma emocionante lembrança.

Rodamos pelo mundo e chegamos na Índia num final do ano de 2009 . Mais especificamente em Port Blair no arquipélago de Andaman Nicobar , região atingida pelo “big” tsunami de 2004 no Indico.

Essa temporada de Índia tem muito a ser dito que em outra oportunidade contarei as particulares desse exótico país.  No momento o que nos interessa é a festividade de passagem de ano a bordo do Karima , ao lado do vulcão ativo de Barren. 

Na internet achei esta referencia :

“O vulcão da Ilha Barren é o único ativo da Índia e ficou adormecido por 150 anos antes de mostrar sinais de 'atividade intermitente' em 1991”. 

Pois bem. Foi fundeado ao lado dele em “atividade intermitente” que fizemos uma bela festa com a tripulação a pedido de convidados familiares de um dos proprietários. Foi uma festa com tudo que tinha direito.


 Muita música , muita comida , muita bebida , alguns adereços de festa muita alegria e um convidado inesperado. Ao invés de queima de fogos , pudemos comemorar a chegada da nova década (2010) com as intermitentes atividades do Barren ao nosso lado que de 30 em 30 segundos  soltava uma baforada “ sonora e fumacenta”. No começo assustava, mas no “andar da carruagem “movida a álcool , acabou sendo divertido. A cada explosão , era mais um motivo de brinde.... e haja brinde como deve ser a mudança de ano com os votos de feliz ano novo.








Assim sendo .

Felizes próximos anos a todos  .... começando por este 2024.

Tim Tim


 🍺🍺🍺🍺🍺

 





Agora , sem vulcões por perto

estaremos juntos

Feliz  2024  pra todos

                        🍺🍺🍺🍺🍺

terça-feira, 21 de dezembro de 2021

Pirata... relembrando Natal na Trindade

 

                                                

 

Amigos da Pirataria Alada  meu cordial :

Feliz Natal a todos

Assim sendo , decidi atualizar este post, incluindo a mensagem abaixo que resume o meu pensamento 

mensagem recebida do meu amigo Camilão, a quem agradeço fraternalmente


Definição de Ilha da Trindade na Internet:

 Trindade é uma ilha vulcânica na costa do estado do Espírito Santo, Brasil, que, junto com Martim Vaz, forma um arquipélago.

A ilha da Trindade fica no extremo oriental da cadeia de montanhas submarinas denominada Vitória-Trindade, distante 1.160 quilômetros do continente, e pertence ao estado do Espírito Santo.

Como podemos constatar , a Ilha da Trindade é pouco falada e pouco conhecida . Poucas pessoas sabem qual é sua importância para o Brasil e poucos sabem quem são os brasileiros que sustentam, e mantem a distante ilha sob domínio dos brasileiros. Como este espaço literário não é fórum educativo, deixo ao livre arbítrio de cada um pesquisar o assunto.

Dito isso passemos a verdadeira aventura vivida naquelas “bandas” oceânicas:

Era dezembro de 1982 , eu um Capitão Tenente Aviador Naval do 1° Esquadrão de Helicópteros de Esclarecimento e Ataque (HA-1) . Havíamos passado por um extenso período de incertezas técnicas em relação a segurança das aeronaves SAH-11 Lynx. Havia um problema de apagamento de motores que foram  modernizados naquele ano. Isso , no entanto não impediu que eu e meu eterno companheiro de Aventuras Aladas , o CT Postarek ( Russo ´para os íntimos ), tivéssemos passado por um apagamento de motor (o primeiro depois da modernização)  durante a Operação Fraterno , na Argentina em novembro 1982 ( logo após o fim da “Guerra das Malvinas”).

Ao chegarmos ao final do ano , nosso comandante do HA-1, CF Chrockatt, vendo que ainda tínhamos combustível sobrando na nossa cota , decidiu que deveríamos utilizá-lo fazendo adestramento de voo por instrumentos voando sobre terra para termos alternativas de pouso , em caso de apagamento de motor. Pelo mesmo motivo, a Esquadra limitou nosso voo a 150 NM (milhas náuticas) de algum ponto de apoio sobre o mar. Assim o Esquadrão decolou com todas as aeronaves disponíveis na época  , 3 para o Nordeste e 3 para o Sudoeste do Brasil no dia 21 de dezembro . Russo e eu fomos para Foz do Iguaçu a bordo da 3023. Voaríamos todos em treinamento, ora em formatura, ora isolados fazendo adestramento de IFR ( voo sob regras de voo por instrumento).

No primeiro dia, chovia mas tudo correu perfeito. Chegamos a Foz do Iguaçu com as 3 aeronaves em perfeitas condições. As três tripulações se reuniram para um delicioso churrasco gaúcho , comemorando um final de ano alegre depois de algum tempo de muito trabalho para colocarmos o HA-1 no patamar que merecia “Esquadrão de Elite” da Aviação Naval.

Decidimos que o regresso seria realizado independente, cumprindo voo sob regras IFR . A nossa 3023 seria a primeira a decolar , observando as condições meteorológicas a frente e informando as demais pelo rádio.

Na primeira pernada , para Cascavel-PR , enfrentamos uma grande tempestade e avisamos as outras aeronaves que vinham atrás. Abastecemos e decolamos com destino a Curitiba. Seria um voo de 2h 30m , quase no limite da nossa autonomia . Ao chegarmos a 15 minutos para Curitiba chamamos a torre :

“ Bacacheri .... Marinha 3023....bom dia .... de Cascavel  para Bacacheri ... IFR ....6 mil pés ...  120 nós ....com 3 no POB ... 15 fora ... instruções “

“ Marinha 3023 .... Bacacheri...informo aeródromo fechado para operação VFR/IFR por condições meteorológica abaixo dos limites ... prossiga para sua alternativa Paranaguá.... tenha um bom voo. “ Respondeu a torre de Curitiba .

Rapidamente refizemos o cálculo para Paranaguá. Teríamos 18 minutos de sobra na nossa autonomia . Chamamos no  rádio a “Alcateia de Linces” que já estavam voando com destino a Curitiba:

“Geral de Linces...Lince 23 ... participo Curitiba fechado instrumento ... alternando Paranaguá...sugiro avaliarem regresso Cascavel”.

“ Lince 23 ... 22... regressando Cascavel “

“Lince 23....28...regressando Cascavel ... bom pouso”

Sabiamente os outros regressaram sem se arriscarem entrar na tempestade que caía em Curitiba.

Cruzamos a vertical de Curitiba sob um tapete de nuvens negras. Ao atingirmos o litoral vimos o mar e por lá descemos e nos dirigimos para Paranaguá visual . Pousamos com 28 minutos de combustível nos tanques.

“ Senhores ... bom dia.... informamos que estamos sem QAV (querosene de aviação ... alimento das nossas turbinas )”.  Foram as palavras do orientador de Paranaguá. Eu e Russo nos entreolhamos com cara de “ e agora? ”.

Pegamos o Mapa ( 1982 não havia GPS ). Joinville seria uma alternativa. A tempestade continuava . A alternativa seria praiodrômico , o que aumentaria a distância para 50 NM. Refizemos todos os cálculos . Estávamos no limite considerando a velocidade de maior alcance.

“ Estamos de acordo ?” . Perguntou o Russo , comandante da aeronave .

“ Alguma vez estivemos em desacordo ?” . Perguntei. Ele sorriu e guarnecemos a 23 e decolamos debaixo de muita chuva.

Atingimos o litoral a 100 pés e continuamos até ingressar na boca da Baía de Babitonga. Baixamos para 50 pés quando a “luz da bruxa” acendeu .

“Joinville... Marinha 3023...de Paranaguá ...visual ... com 3 no POB .... 50 pés ...na Baía de Babitonga ... 2 minutos para pouso “. Falei no rádio.

“Marinha 3023...Joinville ...  pista  em uso 33 ...tenho você no visual...vento calmo ... acuse na final...bom pouso “

“ Marinha 3023 ... pista no visual ... final direta para pista 33”.


Pousamos. Abastecemos e agora seria proa direta para Santos a baixa altitude sobre o mar (nosso habitat natural). Voo de 1h 45 , debaixo de chuva sobre o mar até a “boa e velha” Santos de tantas jornadas. De Santos para São Pedro da Aldeia (caminho da roça).


“ Macega ...Lince 23 ...de Santos para ” casa “... com 3 almas a bordo...5 fora “

“ Lince 23 ... Macega... pista 06... vento calmo ...acuse final “

“ Lince 23 ... na final... Feliz Natal “

“ Macega... ciente...bom pouso ... Feliz Natal “.

Pousamos felizes. Eu e Russo nos cumprimentamos já imaginando as festividades de Natal daquele ano.

O Esquadrão estava vazio . Fomos chamados a câmara do Comandante.

“ Parabéns a vocês dois. Foram os únicos que conseguiram regressar. As aeronaves do Nordeste ficaram retidas em Caravelas em função do tempo. As que estavam com vocês ficaram retidas em Cascavel pela mesma razão. Assim sendo infelizmente tenho que comunicar que amanhã ao nascer do sol estarão embarcando na Fragata Liberal  quando estará passando pelo traves de Aldeia com destino a Ilha da Trindade. O medico da guarnição da Ilha faleceu e deve ser substituído imediatamente. O corpo está sendo mantido na frigorifica e para tal, os gêneros foram retirados . Vocês levarão o novo médico e trarão o corpo , liberando a frigorífica o mais rápido possível. Alguma dúvida ?”

Foram as ordens de um constrangido Comandante  Chrockatt.

“ Não “. Respondeu o Russo olhando para mim.

“ Não eram vocês escalados, mas foram os únicos que chegaram a tempo. Vão pra casa , descansem e tenham um Feliz Natal... se for possível “.

Fomos para casa contar a “boa nova” para as famílias, que já estavam no Rio de Janeiro para as festas de fim de ano.

Ao nascer do sol do dia 23 de dezembro de 1982, Russo, eu , o fiel (que me desculpe , pois não me lembro quem foi ) e o 3023 decolamos e pousamos na F-43 Fragata Liberal , comandada pelo CMG Domingos, quando passavam “turbinando” a 32 nós pelo traves de São Pedro da Aldeia. Não havia tempo a perder . Seriam 740 NM percorridas em 22 horas.

No dia 24 ao amanhecer, estávamos a cerca de 50 NM da Ilha . De comum acordo com o Comandante Domingos , resolvemos decolar com destino a Ilha permitindo que o navio desse meia volta e começasse a regressar . Nós o alcançaríamos voando.

Quando pousamos na Ilha de Trindade fomos instruídos a “ cortar o motor” aguardando o processo de embalsamento do corpo. Consideramos que seria arriscado cortar os motores aguardando o processo que poderia demorar ( caso não conseguíssemos partir, nos tornaríamos monumentos em Trindade sem apoio técnico) . Manter os motores em funcionamento consumiria nosso combustível, impedindo nosso regresso ao navio com segurança. Decidimos voltar ao navio e aguardar o pronto do procedimento médico na Ilha liberando o corpo para embarque imediato. Pousamos na F-43 e aguardamos. Uma hora mais tarde pelo rádio fomos informados:

“ Fragata Liberal ... Estação Oceânica de Trindade... Corpo pronto para embarque “.

“ Trindade ... Liberal ... Falcão 23 ... pouso em 20 minutos “.

Pousamos ... embarcamos o corpo e quando íamos decolar, um fotografo paisano que estava na Ilha , sabe-se lá com a autorização de quem pediu para fazer um sobrevoo da Ilha para uma matéria fotográfica que estava sendo produzida para a Marinha. Ele embarcou e fizemos um rápido ” turn around ” da ilha e o desembarcamos , continuando nossa missão.

Pousamos na Liberal em torno de meio dia. Naquela velocidade (32 nós) , a previsão seria o navio atracar no Rio de Janeiro em torno das 13:00 horas do dia 25 ( em tempo para a tripulação desfrutar um almoço de Natal com a família ). Haja turbina ( nesse tipo de navio elas só eram usadas por pouco tempo em manobras táticas radicais , ou em necessidades humanitárias ).

O corpo foi acondicionado num armário de aço, cheio de gelo dentro do paiol de misseis e torpedos em temperatura controlada monitorada por um marinheiro de plantão. Ele estaria seguro para chegar nas melhores condições para ser periciado , dadas as condições que ocorreram , no isolamento da ilha .

Dia 25 amanheceu e quando tomava o café da manhã , percebi uma certa correria quando o navio reduziu a velocidade. Fui informado que havia um incêndio sendo combatido na Praça de Máquinas. Russo e eu não nos preocupamos. Isso ocorria eventualmente a bordo, mas as equipes de combate a incêndio sempre davam conta. A movimentação não parava e resolvi verificar onde estávamos. 200 Milhas Náuticas de Vitória (terra mais próxima). Não poderíamos decolar segundo a limitação da Esquadra imposta aos Lynx. O comandante entrou no passadiço e quando nos viu , disse :

“ O incêndio está fora de controle . Devo preparar o navio para abandono. O que vocês querem fazer com a aeronave?”.

Eu e Russo rapidamente avaliamos e decidimos abastecer a aeronave até o “talo”. Poderíamos decolar e pedir socorro. Buscar um navio Porta Container no radar e tentar pousar nele e direcioná-lo para resgate da tripulação. Se nada encontrássemos poderíamos ir para terra buscar abastecimento e direcionar o PARASAR. Comunicamos nossa decisão ao Comandante Domingos que deu o Ok e disse:

“ Vou fazer uma nova tentativa enquanto abastecem, cruzem os dedos “.

“Boa sorte”. Desejou o Russo , enquanto nos dirigíamos para o abastecimento da 3023.

Do convoo vimos a equipe de combate a incêndio enfiando uma mangueira pela chaminé da turbina do navio. A ideia do Comandante Domingos era inundar a praça da turbina com “Aero-foan”  (espuma de combate a incêndio de aeronaves movidas a turbinas abastecidas de QAV , querosene de aviação e para turbinas de Navios ). Deu certo !. O “Aero-foan” apagou o incêndio.

Não era mais necessário abandonar o navio, no entanto a nossa velocidade ficou reduzida a 10 nós. Nessa velocidade a cerca de 250 milhas do Rio de Janeiro, a Liberal só atracaria no dia 26. Adeus Natal com a família para a tripulação ... mas não para o Lynx. Estávamos a 150 NM das plataformas de petróleo da Bacia de Campos , portanto , dentro da limitação imposta pela Esquadra ao voo de Lynx sobre o mar. Ponderamos isso com o Comandante Domingos , pedindo autorização para decolar.

“ Autorizo. Obrigado por tudo . Agora estamos com tudo sob controle. Aproveitem o fim do dia natalino juntos as suas famílias. Brindem por nós. Feliz Natal “.

“Feliz Natal ... bom regresso ao Rio. Se tiver algo que possamos fazer e só falar”. Desejou o Russo em nosso nome. O comandante Domingos rascunhou um número num papel.

“Por favor liguem para minha esposa e digam que chegarei amanhã e se ela puder ligar para as outras famílias avisando , eu agradeço. Bom voo”. ( em 1982 não existia o “celular”)

Decolamos . Sobrevoamos as plataformas da Bacia de Campos e pousamos em São Pedro da Aldeia 2h e 30 minutos depois ainda no dia 25 de dezembro de 1982. Do Esquadrão , no hangar com todas as aeronaves e apenas o pessoal de serviço, naquele feriado,  ligamos para o Comandante Chrockatt.

“ Boa tarde, Comandante . Missão cumprida . Lince 23 na toca “

“ BZ . Feliz Natal “ Foram as palavras do Comandante naquele Natal. As outras aeronaves já haviam regressado de Caravelas e Cascavel.

Russo e eu fomos para o Rio sem muita conversa no carro, chegando à noite , carregando mais uma história...triste. Não havia muito a brindar.

Na proximidade deste Natal de 2023, concito a todos “piratas do bem “, alados ou não, a dedicarem alguns segundos durante as comemorações junto a vossas famílias para desejarem silenciosamente, uma boa noite/dia de Natal àqueles que por algum motivo estejam trabalhando em prol da sociedade, seja de serviço , de alerta ou seja lá qual for a atividade profissional que exija trabalho distante de suas famílias.

Essa data se transformou para mim num dia de reflexão. Passei longe da minha família durante o tempo de Marinha , muitas vezes em alerta , outras embarcado cumprindo missão. Quando na aviação executiva estive embarcado na Índia, na Nova Zelândia  e na Tailândia portanto bem longe da família. Na aviação comercial de Off Shore. Minha quinzena voando aeronave ambulância , exigiu meu alerta em Aracaju - SE , Guamaré-RN e finalmente em Paracuru-CE , quando em 2015, fui demitido num dia de Natal depois de cumprir missão. Finalmente pude comemorar o Natal com a família. “Comemorar?... o que? Acho que não sei mais festejar essa data.,,mas relembro todos com quem de alguma forma compartilhei esta data comemorativa.


Tenham todos um Feliz dia de Natal. ( do fundo do coração pirata).



Ao meu particular amigo Russão (companheiro de Natal na Trindade , e a todos meus amigos e amigas), independe de raça, cor ou credo...opção política , religiosa ou sexual ... cargo, função ou situação econômica .... civil empregado, desempregado ou aposentado , militar , na ativa ou na reserva , bonito ou feio , gordo ou magro, careca ou cabeludo ....desejo sinceramente que sejam  ... FELIZES ... todos os dias (inclusive no Natal na Trindade ou seja lá onde estiverem) porque como diz o meu grande amigo Zé Barreira :

" Viver bem ... é apenas uma questão de ponto de vista . Em princípio , o importante .... é estar VIVO "




Vídeo da Marinha sobre a Ilha de Trindade👇





domingo, 5 de dezembro de 2021

Temporada no Panamá - parte 3


A Temporada continua

 


Amigos da Pirataria Alada...meu cordial “Hola!”

A Temporada continuou , e acabou

Antes que a temporada continue, por dever de justiça em prol da verdade, devo esclarecer que o “Sean Pirate” que encontrei no hotel de Santiago de Veraguas, na parte 2 daTemporada, não era o “Sean Connery” e muito menos se chamava “Sean Pirate”. Isso foi uma vontade irresistível deste autor de criar uma situação “baseada em fatos reais... sem compromisso com a verdade” (coisa de pirata). Esclarecimento feito, fato é , que o cara era parecido com o Sean Connery. Ele se chamava John e era piloto de Bell HH-1K IROQUOIS ou "Huey” (para os íntimos), veterano da Guerra do Vietnã , na US Navy . Isso nos aproximou. 

Me apresentei como veterano “Lince Lider” . Ex-Comandante e piloto de Super Lynx do Esquadrão de Ataque da Marinha do Brasil. A partir daí passamos a nos comunicar em um único idioma: “a linguagem dos Piratas”. 

O John conhecia tudo da região e se dispôs a me ajudar no que fosse preciso. Fizemos um sobrevoo do Arquipélago de Coíba, quando ele, de copiloto, me apontou os melhores locais para caça submarina. No regresso me apresentou o “cara” local que sabia todos os segredos dos “pescados” panamenhos. Vimos na Tv Brasil 5 X 2 Costa Rica (nossa vizinha próxima, naquele dia). A noite saímos “descapotados” na Corvette prateada dele, para curtir a noite de Veraguas. No dia seguinte me passou vários detalhes sobre o Arquipélago de Boca del Toro no lado Caribenho.
 
Me indicou, no mapa, que no setor leste do Panamá era mais fácil de ultrapassar a Cordilheira, com montanhas mais baixas que as da região oeste. Recomendou cuidado no deslocamento para Boca del Toro e depois, voo litorâneo para San Blas. Nos deu carona (Junior e eu) na Corvette até o “Aeropuerto Rúben Cantú” de Veraguas. Nos despedimos e decolei com a agradável sensação de ter feito amizade com um verdadeiro “pirata alado”.

Fizemos um voo agradável de 1 hora até o “Aeropuerto Internacional José Ezequiel Hall” de Boca del Toro. Antes do pouso , num sobrevoo sobre a região percebi que era mais turística que Del Rey. Não me pareceu que agradaria aos caçadores de peixe. Havia muito “turista” e nenhuma ilha deserta com ermitões. A região é linda , mas fugia ao objetivo do patrão.

Pernoitamos, colhemos informações turísticas e de apoio a um Iate de 98 pés, abastecemos no aeroporto e decolamos para San Blas. Foi um voo marinheiro, por cima do Mar do Caribe, de 1hora e meia com o bom e velho vento leste de 20 nós nos segurando. Pousamos no Aeropuerto Internacional Enrique Adolfo Jiménez de Colón (de tristes recordações), abastecemos e decolamos para San Blas, “praiodrômico” observando todos os detalhes da linda região.



 Pousamos no pequeno Aeroporto “Corazon de Jesus” que na época, não havia QAV (querosene de aviação) para nos abastecer, mas tinha uma perfeita posição estratégica. Dali , teríamos autonomia no Colibri para atingir um ponto da costa da Colômbia sobre a água , sem sobrevoo do perigoso terreno dominado pelas FARC e seus tiroteios. Isso viria a ser muito útil no regresso. 




Encontramos um simpático Hostel de cabanas na Ilha de Nargará, ao lado da ilha do Aeroporto. Pegamos um “barco taxi” e lá nos hospedamos. Colhemos muitas informações sobre pescaria no local. Também era uma região turística no Mar do Caribe e ficamos por lá até assistir na tv Brasil 2 X 0 Bélgica. Estávamos nas “quartas de final”. Iríamos enfrentar a poderosa Inglaterra, mas, a minha preocupação maior era o planejamento para regressar para o Brasil , passando ileso pela Colômbia.

O dia seguinte amanheceu perfeito para um teste que imaginei. Voo direto de Corazon de Jesus, para Tocumen, sobrevoando montanhas mais baixas evitando o proibido Canal e sem necessidade de ficar “guardado”, novamente. Seria um voo de 40 minutos , e foi. Criei no GPS uma rota a baixa altitude passando pelos vales entre montanhas mais altas do caminho, marcada por guinadas nos WP (way poits) criando um corredor visual. Criei um ponto de pouso para abastecimento por galões, na costa Caribenha do Panamá de onde poderia atingir a Costa noroeste Colombiana sobrevoando o mar, sobre o Golfo Caribenho entre os dois países, sem tiros das FARC.

De volta a Tocumen, hangarei o Colibri sob os cuidados do Pippo e fui para o Hotel aguardando a próxima missão. Durante o dia visitava o Trindade e ajudava a sua preparação no que fosse possível, até nas fainas de “lona e areia” (faxina do barco, para os leigos em pirataria). Durante a noite jantava no Bennigan’s aproveitando a disponibilidade de Internet. Num desses dias descobri uma ferramenta maravilhosa (na época). Era uma tal de “MSN Messenger”. Foi uma revolução comunicativa. Eu podia falar e conversar com minha Sereia , e melhor “vê-la” ao vivo via tela do computador do Bennigan’s.

No dia do jogo das quartas de final da Copa, fui para a Marina Flamenco assistir ao jogo a bordo do Trindade atracado ao cais. Para minha surpresa havia um "Trawler" atracando ao cais, na nossa popa. Os dois iates ficaram próximos popa com popa. Na nossa, já tremulava o “Pavilhão Verde Amarelo”. Ao soar o apito no outro Iate indicando que a primeira espia estava encapelada, vi surgir na popa do recém-chegado uma “Union Jack” (nome da bandeira Britânica). Como manda a tradição naval, fui dar as boas-vindas ao Capitan. Era um típico “Lord Inglês”.

O lord inglês, depois de algum papo, me convidou para batermos uma bola no cais próximos aos barcos. Mesmo sem ser um “Pelé”, topei em nome das boas relações internacionais entre piratas. Ele trouxe uma bola de futebol oficial, novinha, estampada com o Brasão do “english time”. O bate bola começou (sem muita graça e de repente, surgiu como um bólido uma mancha negra que abocanhou a bola, produzindo um furo que imediatamente murchou a bola acabando com a atividade de relações públicas internacionais, entre o “lorde Inglês” e eu. Quando percebi o que havia acontecido gritei :


“ LARGA Capitão ... LARGA” . O Capitão largou a bola e de rabo entre as pernas, voltou para o Iate.

O “Capitão” era o cão, labrador negro, do Comandante do Trindade, que morava a bordo.

“My sincere apologies, Commander....I will provide a new ball.... Sorry!”

Disse constrangido para o “Lorde Inglês”, vizinho de popa. Nos despedimos e cada um foi para sua popa assistir à partida de quartas de final da Copa. Brasil X Inglaterra.

Aos 23 minutos de jogo “Gooolllllll”. Era o grito do “lorde” na popa contrária, pulando e acenando com uma bandeirinha inglesa (não a Union Jack britânica). Aplaudi educadamente a distância, o gol do Michael Owen.

O jogo chegou ao final do primeiro tempo e antes do apito final: “GooooLLL de RRRivaaaldo”.Era o meu grito abraçando a grande bandeira brasileira hasteada na popa. Foi aos 2 minutos dos acréscimos. O Lorde vizinho me cumprimentou a distância.

O jogo recomeçou e aos 5 minutos do segundo tempo. Ronaldinho Gaúcho fez uma mágica cobrando falta na “gaveta direita” do “Seaman” (marinheiro, em português), goleiro inglês na partida. Goooolllllll. Não vi mais o Lorde vizinho. O jogo acabou 40 minutos depois, e o Brasil estava na semifinal.

No dia seguinte meu telefone tocou :

“Parabéns, pirata, como vão as coisas por aí?”. Era o Patrão me cumprimentando pelo meu aniversário e querendo saber o resultado das minhas investigações aéreas.

Agradeci o cumprimento e passei o resultado das minhas avaliações sobre Coíba, Boca del Toro e San Blas.

 “Ok, faremos uma pescaria em Coíba no próximo fim de semana, depois o Trindade atravessa o Canal e vai para Boca del Toro. Passaremos uns dias por lá. Depois disso se quiser ir para casa pode ir. Deixa o Colibri aí. Tire umas férias e regresse em agosto.”. Essas foram as ordens do Patrão.

“Chefe, .... o Senhor quando vier, pode me trazer uma bola de futebol “brasileira, verde e amarela”, se for possível? Estou devendo para um gringo... inglês”. Pedi a ele.

“ Deixa comigo “ . Respondeu sorrindo ao telefone e desligou.

As pescarias continuaram ocorrendo sem grandes novidades. O Brasil bateu novamente a Turquia, na semifinal ( 1 X 0 ). A bola com gomos verdes e amarelos de propaganda da “AmBev” patrocinadora da seleção, foi entregue ao Lorde Inglês que não aceitou bater uma bola comigo no cais, no dia da final entre Brasil e Alemanha. Interpretei que fosse por culpa da Alemanha (eles não se entendem muito bem).

Brasil 2X 0 Alemanha. Brasil Penta Campeão. A comemoração no Panamá foi como se fosse no Brasil. Eles adoravam os jogadores brasileiros Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho e Rivaldo. Me senti em casa na comemoração, mas comprei uma passagem Panamá – São Paulo, para comemorar com a minha Sereia Pi. Era bom voltar para a minha casa de verdade.

No final de julho recebo novas ordens :

“Pirata, já curtiu as férias em casa né? Agora vamos trabalhar. Preciso de você no Panamá para recepcionar dois "amigos nossos comuns". Não poderei estar lá e você será o anfitrião. Eles querem cruzar o Canal do Panamá no Trindade. Faça o que for preciso. Eles chegarão em agosto em Tocumen. Depois te passo detalhes para você recepcionar o casal Brancante e o casal Janot.”

“Ok ... estarei lá “Respondi e ouvi o “click” desligando o telefone.

Fiquei preocupado, porque a temporada de furacões no Caribe, já havia iniciado, ainda sem grandes danos. O Brancante era o proprietário do Iate Lord Gato, Presidente da Associação de Amigos da Marinha em São Paulo, Presidente do Iate Club de Santos, (base da Nau  Arpoadora do patrão) e meu amigo. Amizade forjada quando exerci a função de Chefe da Polícia Naval do Estado de São Paulo em 1996/7. Já o Janot (Vice-almirante) era o DPC (Diretor de Portos e Costas) até abril daquele ano e proprietário de um Iate estacionado em Fortaleza. A minha “amizade” com o Almirante Janot datava dos tempos que eu como piloto de Lynx embarcava na Fragata União comandada por ele e vai até o ano 2000, quando era Comandante do 8° Distrito Naval em São Paulo. Naquele ano de 2000, pedi transferência para a reserva da Marinha por motivos pessoais, enquanto exercia a função de Superintendente do Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo. Naquele dia o Almirante Janot fez questão de fazer a minha despedida no salão nobre do Distrito, onde me presenteou com um quadro, dizendo:


“Este quadro traduz a sua vida na Marinha. Ao fundo, sua cidade natal, São Paulo. Nela, o prédio do 8° Distrito Naval, projetado pelos engenheiros até ontem, seus subordinados no Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo ... e sobre o prédio o mais importante para você: o Super Lynx pilotado por você que inaugurou nosso heliponto em 1998, quando era o comandante do HA-1 (1° Esquadrão de Helicópteros de Ataque da Marinha). Seja feliz Pirata”.

Os dois casais (Janot/Vera Lucia e Brancante/Ana) seriam “nossos amigos comuns ????”. Acho que sim , O patrão estava certo.

Antes de voltar ao Panamá liguei para meu amigo CMG Marinho do COMDABRA, em Brasília. Perguntei a ele se, seria possível pedir a Força Aérea da Colômbia, me autorizar um voo num corredor seguro monitorado por eles, entre Santa Marta na costa do Caribe colombiana e Aruba. Ele prometeu fazer um contato e me avisar da resposta.

Voltei ao Panamá em agosto, a tempo de recepcionar os dois casais amigos. Embarcaram no Trindade, que ganhou uma “máquina de fazer pão” (novidade na época). Curtimos bons passeios. Eles cruzaram o Canal a bordo. Eu fiquei em terra porque o Colibri não podia estar no convés do Trindade durante a travessia por medida de segurança. Tudo correu como planejado na missão social que havia recebido, e os dois casais amigos partiram de Tocumen de volta ao Brasil, no final do mês. Quando liguei para o patrão dando o “pronto” da missão, recebi a seguinte ordem:

“Pirata se prepara para deixar o Panamá. A temporada de furações do Caribe já começou e não é bom deixar o Colibri por aí. O Trindade irá fazer um tour pelo Caribe com uns amigos, sem o Colibri. Você e o Junior voltem pra casa, sem sobrevoo da Colômbia”.

“Chefe se eu encontrar um meio de sobrevoar um “pouquinho” da Colômbia, com segurança das Forças Armadas da Colômbia, o senhor me autoriza?”

“O QUE você está armando”? Ele perguntou.

“por enquanto... nada, mas se o senhor autorizar pode ser”.

“Autorizo ... me mantenha informado”,

Iniciei o planejamento da “ volta pra casa ”.

Depois de um dia de contatos telefônicos com o Marinho em Brasília, recebi o que aguardava: 

“Barreira, a Força Aérea da Colômbia te autorizou um voo direto do Aeroporto Internacional Simon Bolivar, em Santa Marta, para Aruba voando com código transponder militar pré setado. Deverá voar a 500 pés monitorado. Não deverá adentrar ao território Venezuelano quando se aproximar do Golfo Venezuelano próximo a região do “Saco de Maracaibo. É uma área de litígio internacional entre os dois países e mantenha atenção na frequência militar que será passada oportunamente”. Foram as palavras do Marinho.

“YYÉÉÉééSSSS !!!”. Respondi . “Obrigado Mano”. Completei.

O Regresso se iniciou em 11 de setembro (aniversário do atentado em New York no ano anterior) depois que o patrão deu o “OK” dele, nos chamando de malucos de novo.

Depois das despedidas formais e um forte abraço no Pippo, com lágrima nos olhos. Junior e eu decolamos de Tocumen num dia lindo, com destino a “Corazon de Jesus” em San Blas, cumprido o corredor visual que havia traçado no meu GPS meses antes. No bagageiro, galões cheios de QAV, para um abastecimento manual na área de San Blas. Foi um voo tranquilo de 45 minutos. Pousamos em Corazon de Jesus e “atijolamos” o Colibri de QAV manualmente. Decolamos para a pernada de 2 horas e 40 minutos, sobre o mar do Caribe, com alternativa de pouso em Barranquilla, caso o combustível não fosse suficiente para chegar a Santa Marta. Acredito que o combustível abastecido em “Corazon de Jesus” estava “ bento”.

( Eu fiz o meu 1°ano primário no "Liceu Coração de Jesus" de São Paulo em 1961, quando aos 7 anos de idade, ganhei a minha primeira medalha da vida . Naquela época fui bem colocado na turma . Hoje  a uso como "chaveiro talismã ", acho que isso ajudou ) .

Acredito que ele nos permitiu chegar a Santa Marta sem vento naquele horário da manhã. Fizemos um rápido briefing com um oficial da Força Aérea da Colômbia, que me passou detalhes, frequência e código transponder, para o voo que iria cumprir a seguir. “Atijolamos”, de novo o bravo Colibri.

Decolamos para mais um voo de 2 horas e 40 minutos (agora sem alternativa.... era chegar ..ou cair no mar com pane seca). Ao entrar na região desértica cheia de pedregulhos de Riohacha, deixando o “Saco de Maracaibo” a direita começamos a pular por efeito das térmicas do solo desértico. Isso consumiria mais combustível . Me preocupei. Procurei uma altitude de voo mais confortável e econômica usando menos torque. O sacolejo era interminável. Atingi o litoral. Senti um alívio ao ver o mar do Caribe. Não durou muito meu alívio. Sobre o mar encontrei um velho conhecido, o vento leste do Caribe. Me preocupei ainda mais. Pelo rádio agradeci aos militares colombianos e me despedi. Agora seríamos só eu, o Junior, e o Colibri e o combustível de Santa Marta, o de Corazon de Jesus “bento”, já tinha sido usado. Pedi mentalmente que “Netuno”, conversasse com a Santa Marta sobre o nosso combustível. Fazia cálculos frenéticos olhando o “fuel Indicator” cruzando informações com o tempo de voo estimado para pouso, no GPS . Ao mesmo tempo buscava ver o perfil da baixa ilha de Aruba, no horizonte marítimo, meio encapelado. A ansiedade começava a tomar conta e me perguntava se Netuno havia conversado com Santa Marta. Aos 15 minutos para pouso eu estava há 24 milhas de Aruba sem a ilha no visual com vento contra. Relaxei. Acendi um cigarro e com calma perguntei ao Companheiro Junior ao meu lado :

“Está preparado para pouso na água e abandono da aeronave?”

“Claro! não foi pra isso que fizemos o curso de UTEPAS (Unidade de Treinamento de Escape de Aeronave Submersa) na Base em São Pedro da Aldeia?” Foi a resposta dele. 

Era verdade. Eu havia exigido que todos os tripulantes e familiares do patrão fizessem o curso de UTEPAS no CIAAN (Centro de Instrução e Adestramento Aeronaval), antes de aceitar operar nos iates dele. Ele obrigou a todos a cumprirem o treinamento. Satisfeito com isso, dei um profundo trago no cigarro, como se fosse o último. Apurei os olhos no horizonte e notei Aruba brotando do mar. Joguei o cigarro pela janela. Olhei o GPS que acusava 6 minutos para pouso e a luz da bruxa não estava acesa no painel. Afoito chamei no rádio:

“Aruba ... PP-MOE ... from Santa Marta, Colombia ... visual to Aruba ... 500 feet ... 90 knots ...

QDM 258 ... 5 minutes to land”.

“PP-MOE... Aruba...Good afternoon... Aruba operates visual...with calm wind... notify in final

for approach to helipad...welcome to Oranjestad”. Respondeu a torre com simpatia.

“Vento calmo????” Reparei que o vento havia cessado. Pensei: “Acho que Netuno finalmente conversou com Santa Marta”. A “luz da bruxa” acendeu no painel de alarme, quando transmiti:

“Aruba ... PP-MOE ... in final... Thanks...”

Pousamos. Deixamos o Colibri hangarado e fomos para o paraíso de “Flamingo Beach” do Renaissance Resort, encher a cara agradecendo a Netuno, Santa Marta, Corazon de Jesus, ao Marinho e a Força Aérea Colombiana. Junior e eu brindamos a um aniversário de 11 de setembro sem tragédias.

Passamos 2 dias em Aruba refazendo as emoções. Regressamos pela mesma rota, da vinda. Já era um “caminho da roça (ou da praia)” conhecido. Em Paramaribo só paguei 100 dólares ao "flanelinha aéreo" , estava na promoção e já era cliente "frequente". Em Macapá não precisei fazer importação temporária.

Em Brasília , agradeci ao Marinho que não sabíamos, mas em 2006, começaria a fazer parte da “equipe de Piratas do Patrão”, quando passou para a Reserva da Marinha.

Deixei o Companheiro Junior em Cabo Frio e voei pra casa no Guarujá, onde a minha Sereia Pi me esperava, como sempre. A beijei e a abracei forte.


 Peguei o celular e fiz uma ligação

“Chefe ... Colibri em casa. Missão cumprida”.

“Vocês são malucos. Sejam benvindos. ... Você sabe que o Trindade foi colhido pelo “furacão Lili” lá no Caribe e está todo arrebentado ?... mas a tripulação está bem ”


Eu não sabia. Provavelmente ele não abasteceu em “Corazon de Jesus” quando esteve em San Blas.


              The End

    Homenagem Póstuma  ao " Excepcional Pirata do Bem "

Carlos Brancante ....um grande "amante " da Marinha do Brasil

                               meu amigo



Agradecimento especial ao

Comandante Eduardo Baruffi Valente

Meu amigo de muitos anos , filho de oficial da FAB , colega do meu pai na FAB . Colega de curso preparatório do Almirante Werneck em São Paulo, meu Companheiro e Sócio  de operações náuticas na Amazônia, meu colega de CAAVO ( Curso de Aperfeiçoamento de Aviação para Oficiais) , pirata alado colega de aventuras no HA-1 (1° Esquadrão de Helicópteros de Ataque ) meu vizinho de condomínio Nau da Barra, e finalmente agora , meu crítico literário e supervisor das minhas histórias publicadas  (quem não gostar delas ..... reclama com ele )

Obrigado, por tudo ,  meu amigo " Camelão "



Homenagem a todos Piratas da TURMA CONDE 


..................e suas SEREIAS , companheiras constantes desse bando de Piratas do Bem




                                  Parabéns  

 ATAC -Associação da Turma Aspirante Conde 



Com um grande abraço e beijo à todos Piratas e Sereias ATACantes 

 Pirata Alado e Sereia PI


CORREÇÂO :

Eu errei. Por uma questão de justiça , agradeço ao meu amigo Lince companheiro , meu ex -chefe de manutenção, leitor atento das minhas his/estórias,  CMG Companhoni, sobre um erro imperdoável que cometi, trocando os nomes de "santas". Traído pela minha memória (já cansada e falha) troquei o nome da localidade na Colômbia de "Santa Marta " para  "Santa Maria". Já providenciei a correção e a todos peço desculpas pelo erro que cometi.

Valeu meu amigo pirata alado Companhoni