Este post é mais um agradecimento a RMB (Revista Marítima Brasileira ), que em sua edição V.143 n°01/03 janeiro/março 2023, publicou na "O LADO PITORESCO DA VIDA NAVAL " o texto abaixo de autoria do meu amigo Comandante Barreira. Além de publicação oficial da Marinha do Brasil centenária, antes do evento "internet", sempre foi uma referência de artigos técnicos e históricos de credibilidade para leitores interessados em assuntos ligados ao MAR ( sendo Piratas ou não),
Assim sendo reproduzo , o artigo da RMB , incluindo algumas fotos do arquivo do Pirata Alado
GAIBÚ ... Lenda ou Mito?
Vivíamos tempos difíceis nos anos 80.
Eu fazia parte do HA-1 (1° Esquadrão de Helicópteros de Esclarecimento e Ataque Anti-Submarino ) da Força Aeronaval.
Naquela época o HA -1 operava as aeronaves SAH-11 Sea Lynx, há pouco, adquiridos pela Marinha para comporem o sistema de armas das novíssimas Fragatas classe Niterói. Como projeto novo que operava com motores GEN 2 Rolls Royce, os Lynx sofriam pela pouca “experiência”, causando alguns “sustos” em voo aos seus tripulantes, como apagamento em situações desagradáveis (voando em cima d’agua por vezes à noite). Esses sustos causavam algum “receio” aos tripulantes, que nos obrigava, buscar um incentivo suplementar para cumprirmos nosso dever de militares profissionais ... “destemidos “.
Depois de muitos esforços técnicos visando melhorar o
desempenho dos nossos motores, o Comandante do Esquadrão, CF Chrockatt, a luz de sua experiência na
Inglaterra, determinou uma divisão de sua tripulação em DAEs (Destacamentos Aéreos
Embarcados) inspirado na operatividade da Royal Navy. Dessa forma, cada DAE ficaria responsável por duas aeronaves, tanto no aspecto operativo quanto na
manutenção das Aeronaves.
O 3° DAE foi composto inicialmente,
pelos CT Albuquerque Lima, CT Postarek , CT Barreira, SG Willian, SG Basílio, CB Mathias, .... e mais alguns Cabos e Marinheiros que me
desculpem não lembrar seus nomes, passados mais de
40 anos. Seríamos responsáveis pelos Lynx 3025 e
Lynx 3026.
Todos trabalhavam com afinco por horas visando garantir, além de eficiência operativa a melhor e
confiável manutenção, garantindo acima de tudo
segurança a nossa atividade aérea em condições de alto risco. Todos nós
precisávamos de alguns momentos de descontração e orgulho pelo trabalho que
todos realizavam. Quando uma de nossas aeronaves (Lynx
3026) foi a primeira a completar 1.000 horas de voo, foi motivo de muito orgulho para toda equipe do
3° DAE. Resolvemos fazer uma pequena
comemoração intima batizando a “nossa” aeronave com
um nome próprio para ressaltar a sua eficiência.
Depois de algumas conversas,
resolvemos criar um nome que resumisse as qualidades de voo de nossa aeronave, tanto sobre a superfície marítima (tal qual
uma GAIVOTA), quanto sobre solo terrestre (tal qual
um URUBÚ). A união romântica, das duas aves, gerou o nome de uma máquina de
guerra hibrida, o GAIBÚ, mantida e operada por
homens inoculados pelo “sangue de lince”!
Não bastaria apenas um nome.
Seria necessário que houvesse uma “lenda “que
sustentasse o nome. Assim
sendo me dispus a”
deitar letras sobre papel “antes da cerimônia de batismo e criei a “LENDA do GAIBÚ “.
“Diz a lenda que certo
dia, uma garbosa e alva, gaivota exibia sua destreza e finesse de voos rasantes
sobre os mares bravios, em quaisquer condições de tempo (e mar), principalmente sobre o Atlântico Sul. (há quem afirme que seria descendente de Fernão
Capello Gaivota de Richard Bach). Neste dia, num
dos voos próximos a região montanhosa do litoral fluminense,
mais especificamente dos morros do Pão de Açúcar e Corcovado,
observou um orgulhoso Urubu Rei, de brilhantes
penas negras sobre uma penugem branca na parte abdominal,
que pairava se exibindo, numa térmica sobre a região da Gávea. Em que pese as diferenças físicas e de
coloração das plumagens, houve uma admiração mútua. Cansadas da atividade aérea, coincidentemente,
as duas aves resolveram pousar lado a lado para descanso na copa da mesma
Palmeira Imperial do Jardim Botânico carioca. O que ocorreu na Copa da Palmeira
Imperial não se sabe, mas que esse encontro gerou
um ser alado acinzentado de barriga branca, muito
forte e determinado quando rompeu a casca do ovo as margens da Lagoa de
Araruama, isso é fato indiscutível. Era um animal híbrido com características
muito particulares. Corajoso, agressivo e ao mesmo
tempo justo e defensor de mais fracos. Dominava com
perfeição a arte de voar sobre terra e principalmente sobre o mar, mesmo se mantendo pairado no ar. Sua perspicácia, flexibilidade e rapidez,
o levou a ser comparado a um Lince .... Assim nasceu o GAIBÚ o filho da Gaivota e do Urubu.”
“- Chefe ... estou cursando “Letras”
na Faculdade de Cabo Frio a noite ... e ontem tivemos uma aula sobre mitologia Grega.
Eu adorei a aula e me interessei pelo tema. Por
causa disso, gostaria de saber mais sobre a
interessante Lenda do Gaibú . O Senhor sabe se ela pertence a alguma dessas
mitologias que estou estudando? “
Confesso que fiquei sem saber o que responder. Por alguns
segundos fiquei curtindo um prazer solitário degustando aquela pergunta sobre a
minha “obra literária” e respondi:
“- Seja bem-vindo ao 3° DAE,
marujo...não sei se esta lenda pertence a alguma mitologia ..., mas descobriremos, quem sabe antes da 3026
completar 10 mil horas de voo. Vamos juntos colar o adesivo GAIBÚ na
aeronave.... e comer bolo com guaraná ....”
Hoje, mais de 40 anos se
passaram ...e não sei mais, quantas horas de voo
realizou o Lynx 3026 pelo mundo defendendo as cores da Marinha do Brasil ...
quantas vidas ajudou a salvar ... por quantas atualizações técnicas passou ...e
principalmente, no que se transformou o GAIBÚ ...
se LENDA ou MITO.