sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Pirata...e o Pelé

Pirata...e a Carta ao Pelé

 Amigos da Pirataria Alada ....meu pesaroso ...Olá


Triste resolvi deitar letras sobre recordações que em função dos últimos acontecimentos no Brasil , me entristeceram.

Me reportei ao ano de 1968 , quando então vivendo o décimo quinto ano da minha existência no auge de uma adolescência livre de “propalados” autoritarismos realizados por um digno governo encabeçados por cidadãos patrióticos que exerciam as suas funções honestamente dirigindo um país democrata e capitalista conhecido internacionalmente como “ Milagre Brasileiro “.

Naquela época , eu era um jovem estudioso que amava futebol , incentivado por uma orgulhosa Seleção Bicampeã do mundo , que encantava pelas habilidades de um cidadão conhecido como Pelé. A fama deste cidadão extrapolava as fronteiras do país que se encantavam com este original produto humano brasileiro . Um homem negro , de origem pobre , esforçado, honesto que havia prestado “patrioticamente “ o serviço militar obrigatório (independente da sua fama ) sem sofrer qualquer tipo de preconceito . Este homem havia se tornado um exemplo daquilo que o jovem adolescente que eu era ... queria me tornar : Realizado profissionalmente , honesto , respeitado e principalmente ... livre e feliz ! ( eu só não tinha a habilidade deste cidadão ).

Em 1968 eu cursava o 3° ano do ginásio ( período escolar de 4 anos na época equivalente aos 4 anos finais do ensino básico de hoje em dia). no Instituto de Educação Fernão Dias Paes  (colégio estadual de São Paulo localizado na Rua Pedroso de Morais próximo a antiga rua Iguatemi hoje , Avenida Faria Lima ).

Em novembro de 1966 foi inaugurado primeiro Shopping Center do Brasil  com o nome da rua em que estava localizado o Shopping Iguatemi . Esta novidade chamava atenção de todos , inclusive do jovem adolescente que amava os Beatles e os Roling Stones , que ofereciam suas músicas em discos de vinil vendidos numa loja chamada “Hi-Fi “ instalada nesta novidade Shopping Iguatemi perto do meu colégio . Nada mais justo que eu aproveitasse a novidade ao meu alcance para ouvir Beatles de Rolling Stones nas cabines da loja Hi-Fi , antes de adquirir os disquinhos pretos oferecidos. Para tal , em 1968 , eu tinha que escolher entre , ir a aula ... ou ir ao Shopping (algumas muitas vezes).

Concorrendo com o Shopping, as quartas feiras da semana ,  eu tinha que decidir entre ele , ... e o cidadão Pelé que costumava fazer suas apresentações no Estádio do Pacaembu ou no Parque Antártica (também próximos ao meu Colégio Fernão ). Preferi privilegiar a atividade esportiva em contrapartida a atividade musical às quartas feiras. A atividade estudantil ficou em segundo plano. Eu adorava ver o malabarismo do artista Pelé , desmoralizando times da época como Corinthians no “barranco” do Pacaembu , assim como o Palmeiras , nas “gerais” do Parque Antártica, Naturalmente me tornei  torcedor do Santos FC , sem nunca ter ido à cidade de Santos .

Meus pais sempre me deram muita liberdade . Eu era um bom aluno com notas boas , portanto desfrutava da confiança total , o que não exigia preocupação por parte deles comigo. Isso não foi bom. Acho que me excedi na dose de privilegiar as minhas atividades musicais e esportivas em detrimento das educativas , sem a aprovação dos meus confiantes pais ( me penitencio por isso ).

O resultado de toda essa situação . ao final daquele ano foi a seguinte : Fui impedido de fazer as provas finais por excesso de faltas as aulas , com consequente reprovação no 3° ano ginasial para total decepção dos meus “confiantes” pais. Assim era feita a justiça estudantil num colégio estadual de São Paulo na época da democracia implantada pelo Regime Militar . Eles estavam certos. Eu perdi a confiança dos meus pais. Reconheci o meu erro e lutei para readquirir a confiança perdida dos meus pais. Esse período difícil levou 2 anos .

Deixei de frequentar por prazer Shoppings Centers (só por necessidade ) . Passei a desfrutar o malabarismo de Pelé pela televisão (ainda meio novidade da época ) , ou nos finais de semana nas arquibancadas da vida. Frequentei com assiduidade e interesse os bancos escolares. Faltava a confiança dos meus pais .

Em 1970  a maior conquista pessoal (minha e do Pelé).

21 de junho de 1970. Eu assistia a final da Copa do Mundo de Futebol , numa pequena televisão de 14 polegadas , instalada na garagem da minha casa junto a 2 amigos meus que haviam perdido o 3° ano ginasial junto comigo em 1968. Nó três vibramos quando aquele cidadão negro brasileiro ex reservista do Exército deslumbrou o mundo fazendo a sua mágica trazendo os holofotes do mundo para um país que se desenvolvia 10% ao ano e era respeitado por todos (além de adquirir permanentemente a Taça Jules Rimet ). O país era dirigido por governantes militares , onde pessoas honestas , viviam livres e felizes. Já ladrões e mal feitores eram presos ou fugiam do Brasil para países de liberdades questionáveis .

Naquele 21 de junho , ao final do Jogo Brasil 4 X Itália 1, eu e meus dois amigos fomos para a Rua Augusta (famosa rua de concentração de jovens em São Paulo ). Na Augusta encontramos a rua lotada de carros completamente engarrafados sem a menor possibilidade de se movimentarem . A multidão , impossibilitada de se locomover , assim como os motoristas , decidiram por unanimidade ,  caminharem , por cima dos carros  ( por incrível que possa parecer ). Todos estavam alegres , felizes e livres. Não houve nenhum TIRO . Não houve nenhuma prisão ou confronto. Todos se abraçavam . Quando o relógio determinou que seria “meia noite “ ... eu , e meus dois amigos brindamos com a cerveja Antártica que portávamos. Eu estáva completando 16 anos de existência naquele  22 de junho de 1970 . Meus amigos começaram a cantar parabéns a você ... e foram acompanhados por grande parte da multidão da Augusta ... que interromperam a cantoria da música “Pra frente Brasil “ entoada por todos.

Foi um dia de aniversário inesquecível ... para mim.( graças ao Pelé ).

1970 chegou ao fim.  Em dezembro me deparo com uma notícia no principal jornal paulista “ O ESTADO DE SÃO PAULO “ . Numa das páginas internas o título mostrava : “ Lista de Aprovados no Concurso para o Colégio Naval “.

Comecei a ler o artigo . Era uma lista de nomes que estavam em ordem alfabética . Quando busquei a letra “J” havia vários Josés . Eu era um deles !!! Sorri ...chorei... meu coração disparou . Corri para casa com o jornal . Mostrei ao meu pai , que nada disse ... só chorou  (foi a primeira vez que o vi chorar ). Peguei uma pequena maleta e coloquei algumas roupas . Embarquei num ônibus e fui para Pilar do Sul (interior de São Paulo) me isolar num sítio que meu pai e eu estávamos reconstruindo. Eu havia reconquistado a confiança dos meus pais.

Fiquei sabendo que meus dois amigos de infortúnio de reprovação em 1968 , que haviam feito concurso comigo , seguindo meus conselhos quanto a mudança de nossas prioridades. não foram aprovados em 1970. Um deles tentou outra vez em 1971 e foi aprovado fazendo carreira na Marinha. Hoje já nos deixou precocemente por problemas de saúde . Ele havia tomado um tiro na barriga antes de entrar para a Marinha, consequência de uma disputa romântica com um soldado da Força Publica de São Paulo em 1969. O outro amigo , não prestou novo concurso para a Marinha e nem para nenhuma outra atividade profissional . Preferiu ganhar a vida com a “lúdica” atividade que progredia na época  traficando e distribuindo “ Marijuana”. Acabou exagerando na dose de outra novidade , “ o pó de cocaína “ , e acabou morrendo de over dose .

 Contada esta história integralmente verdadeira só me resta agradecer ao cidadão Pelé que nos deixou agora.

Pelé

Obrigado por ter sido o cidadão brasileiro que ofereceu o seu exemplo de vencedor , atleta  patriota , honesto, humilde , independente de raça, cor e opção sexual ou religiosa , de qualquer nacionalidade ... sem nunca abandonar os seus princípios pessoais...respeitando a todos.... , à um adolescente que andou perdendo o rumo em 1968.

Obrigado Pelé

Assinado

Pirata Alado