domingo, 31 de outubro de 2021

Pirata....e a pescaria secreta

 

Amigos da Pirataria Alada 

Meu cordial...שלום לכולם 

( "olá pessoal" em hebraico , como convém para o momento )
 

Há alguns anos, conheci um cidadão, numa reunião de veteranos em Las Vegas, que se apresentou como Coronel do Exército israelense, ex-agente da Mossad e atual proprietário de uma empresa de segurança particular especializada em proteger bilionários.

Pois bem , esse senhor na época tinha em torno de uns 60 anos e me contou, entre um gole e outro de Budweiser, a seguinte história:

“...Eu estava no Brasil contratado por um Senhor , cujos filhos haviam acabado de sofrer uma tentativa de sequestro  em São Paulo. O carro blindado dos filhos teria sido fechado numa rua sem muito movimento no Jardim América em São Paulo.  Os sequestradores mandaram o motorista abrir a porta ameaçado por metralhadoras e ao invés de cumprir a ordem , o motorista acelerou pra cima dos sequestradores que abriram  fogo atingindo  o carro blindado que conseguiu fugir para uma aérea movimentada da cidade ,salvando as três crianças, filhos do meu contratante, que não estava no carro. Essa tentativa de sequestro chegou a ser noticiada na época, mas logo saiu das páginas dos jornais porque o contratante  em questão nunca fez questão de ter holofotes da mídia.

Esse contratante tinha mais dois sócios que também ficaram preocupados com a segurança das famílias num país violento como o Brasil. Em função disso resolveram procurar os serviços de segurança privada num país de renomada reputação nesse tipo de serviço...e assim a minha empresa , foi contratada.”

Ao chegar no Brasil  tomei conhecimento dos detalhes do sequestro e disse ao contratante que para fazer um plano de segurança para ele e seus sócios, queria passar uns 2 meses conhecendo as atividades das três famílias e conhecer todos os empregados mais próximos e que tinham atividades permanentes , já que acreditava que o atentado teria acontecido a partir de informações de algum desses empregados. Além disso o plano de segurança seria não ostensivo e estanque o que significaria, que os agentes contratados não seriam identificados como tal e as informações dos empregados seriam monitoradas.

Um dos  sócios tinha por hobby a caça submarina e para tal fazia uso de além de uma lancha catamarã de 50 pés muito rápida e um helicóptero colibri recém adquirido onde ele fazia uso nas temporadas de verão em sua casa em Cabo Frio. O planejamento de segurança, dessa atividade, envolvia conhecer o comandante da lancha e o comandante do helicóptero, muito próximos do contratante. Assim, pedi para participar de uma pescaria padrão para observar os dois funcionários em questão.

Ao chegar em Cabo Frio, me surpreendi com a execução de briefing na véspera da pescaria que fora marcada para o dia seguinte ao nascer do sol...e mais ainda, como a pescaria seria realizada com um helicóptero e onde seria realizada.

No briefing  de planejamento apresentado pelo comandante do helicóptero com a participação do comandante do barco,  assistido pelo contratante e por mim, fiquei sabendo que a “caça submarina” seria executada a cerca de 50 milhas da costa, e pior , numa área proibida...na Bacia de Campos, área petrolífera controlada e interditada a voos não autorizados pela Petrobras e pela ANAC...além de proibida a aproximações de embarcações pela Marinha.

Ao saber desses detalhes da operação  perguntei:  por que pescar numa área tão controlada e complicada?

A resposta veio do contratante: se você pretende bater recordes de caça submarina tem que pescar num lugar onde ninguém mais pesca !

Assim o briefing continuou e fiquei sabendo que teríamos que pular do helicóptero na água,  e pra isso passaria por um rápido treinamento em terra antes de embarcar na aeronave ao nascer do sol do dia seguinte. Fiquei sabendo também que o barco estaria posicionado a cerca de 5 MN da plataforma mais próxima (no limite externo sul da Bacia de Campos), e contra o sol para evitar a identificação da matrícula do helicóptero que teria voado a 50 pés da agua , com transponder desligado, para evitar a detecção do radar de controle de trafego aéreo de Macaé que controlava o trafego de helicópteros offshore portanto com ângulo de antena otimizado para detecção acima de 1000pes.


Caso a lancha fosse avistada a 5 milhas da plataforma....estava autorizada a usar velocidade máxima para sair da aérea restrita o que só ocorreria depois que o Navio Patrulha da Marinha , que estava em Macaé (50 MN do ponto), fosse acionado (sendo monitorada na frequência entre Petrobras e Capitania dos Portos).

Findo o briefing todos foram dormir se preparando para a “pescaria proibida” do dia seguinte.

O dia seguinte amanheceu com um problema: Uma camada espessa de nuvens colada ao mar chegando a 100 pés no topo, o que impedia a visualização do mar mesmo com céu limpo acima.


Não demorou muito para o comandante do barco, já posicionado antecipadamente, chamar o helicóptero, que ainda não havia decolado, numa frequência previamente combinada usando códigos cifrados, dizendo que na posição estava tudo coberto e sem visibilidade para fazer o desembarque aéreo dos pescadores.

Nesse momento todos os participantes ficaram de acordo em fazer uma tentativa já que o voo duraria cerca de 30 minutos. Nesse tempo as nuvens poderiam se dissipar com o aquecimento solar, ou abrir algum “buraco” que permitisse a visualização do barco pelo helicóptero. Ficou acertado que caso isso ocorresse na próxima meia hora o barco se posicionaria sob os raios solares que certamente estariam penetrando na camada de nuvens e passaria a posição GPS para o helicóptero. Não entendi nada, no momento, por que todo esse acerto foi feito no idioma português que eu não dominava. Só depois me esclareceram.

A aeronave decolou...e por cerca de 20 minutos voou a 100 pés raspando o topo das nuvens em total silencio radio e eletrônico .... até que o rádio soou : “colibri...tubarão...buraco ....(números cifrados correspondentes a LAT/LONG posição GPS) ...

A resposta foi apenas dois toques do gatilho rádio do cíclico!

10 minutos depois o helicóptero penetrou num buraco nas nuvens visualizando o barco, baixou para 25 pés da água e em menos de 1 minuto nós dois ( o contratante e eu) pulamos do helicóptero no mar ...e ao subir para superfície ... fizemos sinal de ok !... o helicóptero decolou e desapareceu no meio das nuvens. Nadamos até o barco e passamos o dia “caçando “ peixes sem maiores problemas. Regressamos para Cabo Frio ,ao por do sol na rápida lancha catamarã

A noite , no jantar na casa do contratante, os 4 homens  degustavam um delicioso dourado na brasa (pescado no dia) regado a vinho de primeiríssima qualidade...Eu impressionado com a precisão da operação,  coronel do exército israelense e ex mossad pedi a palavra e ofereci um brinde a operação que havia participado dizendo em inglês...: ”poucas vezes eu vi uma operação tão bem preparada e executada no meu pais ...parabéns !.. CHEERS!” 

Todos brindaram...mas o piloto não bebeu o vinho porque teria que estar pronto para voar a qualquer hora ...se fosse necessário.

Quando parecia que não haveria mais manifestações o orgulhoso contratante levantou-se e propôs um novo brinde...agora em português :

 Um brinde a Marinha do Brasil ...em particular ...ao esquadrão HA-1...e olhando para o piloto ergueu a taça....e disse SAUDE !

Não entendi nada ....mas brindei ....SAUDE ! “  



Após ouvir a emocionante história do meu novo amigo Veterano israelense , tomei um longo gole de Budweiser ... brindamos...novamente  SAUDE . Meu pensamento me transportou à São Pedro da Aldeia.....  



AVISO AOS NAVEGANTES :

Esta estória é pura ficção , produto da mente criativa de um pirata que não tem o que fazer e se diverte inventando estórias, não devendo ser levada a sério.

Qualquer coincidência com pessoas ou fatos reais é apenas uma mera coincidência 



quinta-feira, 28 de outubro de 2021

Pirata......e a Terceira Ponte de Vitória

 

Amigos da pirataria alada....meu cordial Bom Dia.

Hoje , incorporado como VETERANO , pedi autorização ao Pirata Alado para transcrever aqui, matéria publicada pela respeitável Revista do Clube Naval, em sua ultima edição.

Mais uma vez me permito divulgar publicações de outros espaços literários, com o único intuito de enaltecer a nossa querida Marinha do Brasil. Desta maneira , desfrutem mais uma das aventuras vividas pelos Piratas do Bem que  povoam nosso dia a dia.

A Terceira Ponte salva vidas

Vitória sempre foi um dos portos mais visitados pela Esquadra nos anos 80. A localização geográfica de Vitoria do Espírito Santo , assim como Santos no Estado de São Paulo, tanto pela qualidade dos serviços portuários quanto pela proximidade da Base Naval do Rio de Janeiro, sede da Esquadra, ofereciam economia logística e facilidade de planejamento para os diversos exercícios de adestramento e preparo para nossas tripulações embarcadas. Numa dessas Operações realizadas pela Esquadra, havia o PAD / CIASA onde um navio era inspecionado em todas as suas atividades visando a sua prontidão operativa.

A Fragata Independência era ,em 1990 , um dos navios mais modernos construídos no Brasil .

Foi em junho que a Fragata Independência , cumprindo a FASE III de seu PAD /CIASA aportou em Vitória. A bordo da F44 estava um Lynx SAH 11 do Primeiro Esquadrão de Helicópteros de Esclarecimento e Ataque A/S (HA-1) . Eu era o chefe do DAE (destacamento aéreo embarcado) sendo acompanhado pelo jovem tenente do Esquadrão, CT Carneiro, que viria a ser o meu fiel Imediato 8 anos depois, quando assumi o Comando do Esquadrão. Atracamos em Vitória depois de intensos exercícios. Vitória sempre foi uma adorável cidade . Sua beleza e culinária típica, além da famosa  simpatia capixaba  sempre atraiu os marinheiros. Conosco , não foi diferente. No dia da partida, uma forte frente fria se apossou do céu, despejando uma tempestade com ventos muito violentos , diminuindo a visibilidade e tornando o mar um desafio para qualquer “lobo do mar”. A brava Independência deixou a “alcateia” para sua prova definitiva nessas condições.

Durante a navegação pelo canal portuário fui para convés de voo para observar as condições meteorológica , me preparando para os próximos, difíceis , voos que viriam naquelas condições. Ao cruzarmos o vão central  da Terceira Ponte, observei a boreste as instalações da Escola de Aprendizes de Marinheiros em Vila Velha e apreciei a grandeza  da obra civil da ponte projetada sob responsabilidade do escritório Figueiredo Ferraz Engenharia de Projetos S.A. Era uma obra de arte e pensei : “seria até perfeitamente seguro passar voando sob este vão central de 260 metros , de altura ,se fosse permitido “ .

Deixamos o canal e botamos a “cara a tapa com balanço” no mar aberto. Os exercícios internos a bordo começaram intensos. A Independência se portava como uma verdadeira” Nau Veterana” apesar da pouca idade. Já havíamos navegado cerca de 50 milhas náuticas, quando um alarme de postos de combate soou no fonoclama. Rapidamente corri para o passadiço para me inteirar da situação. “Seria apenas um exercício”, pensei. Não era!

Ao chegar ao passadiço fui informado pelo Comandante sobre a situação: ”encontramos um barco pesqueiro  naufragando. Tudo indica que há dois homens na água e um se segurando no mastro do barco afundado , vamos realizar o resgate dos homens com as lanchas do navio . Esteja preparado para transportar para terra se não tivermos condições de tratá-los a bordo “ .

Imediatamente determinei ao DAE a preparação do helicóptero para transporte de acidentado e fui me inteirar das condições para um voo para Vitoria. Não eram boas as condições de voo : chuva torrencial , visibilidade próxima de zero , ventos fortes e mar com intensa movimentação para uma decolagem segura. Além disso Aeroporto de Vitória (SBVT) estava fechado para operações VFR/IFR (instrumento). Consultei a Escola de Aprendizes em Vila Velha sobre a capacidade sanitária , que confirmou ter condições de atender emergências e caso fosse necessário, teriam uma ambulância para translado para hospitais mais capacitados. Só me restava aguardar o resgate dos náufragos e esperar a decisão do comandante do navio.

A faina de resgate foi complicada , o estado do mar dificultava todas as ações. Depois de muito esforço os três pescadores foram resgatados e trazidos para a enfermaria do navio. O médico de bordo providenciou todos os exames necessários e constatou que um deles estava em condições criticas e diagnosticou que não teria condições de garantir sua sobrevivência com os recursos a bordo. Pediu a remoção do náufrago que seria acompanhado por ele até um hospital. O comandante do navio analisou toda a situação e decidiu pelo translado de helicóptero para o aeroporto de Vitória que teria uma ambulância aguardando. Seria a decisão mais apropriada , caso SBVT não estivesse fechado para operações IFR (regras de voo por instrumentos).

A missão me foi passada e ponderei com o comandante : posso até pousar na “marra” em SBVT , no entanto isso vai gerar um “incidente aeronáutico” onde talvez eu tenha que perder tempo me explicando. Mesmo que tudo fique explicado (se não ocorrer nenhum imprevisto ) terei atrasado a operação do navio . Na minha opinião o desembarque do acidentado pode ser feito na Escola de Aprendizes , de médico para médico com todo apoio , sem interferência da burocracia aeronáutica civil , nesses casos .”

“ Imediato, faça contato com a Escola de Aprendizes em Vila Velha para se prepararem para receber o Lynx com um naufrago em emergência !” foi a rápida decisão do Comandante.

Decolamos , Carneiro e eu , com o médico do navio monitorando o náufrago deitado na maca. A visibilidade era quase nula quando deixamos o convoo pela intensidade da chuva. Decidi manter 100 pés vendo a espuma do mar bravio até atingir visual da areia da praia de Camboriú . Dali para Vila Velha “praiodrômico” seria fácil ( segundo o velha águia “Tio Ney “ que dizia : me dê uma praia e chegarei ao Alaska) . Não foi fácil , nem precisei chegar ao Alaska, mas precisava chegar a Vila Velha, e no caminho existia uma ponte de 300 metros de altura ( cerca de 1000 pés) que a mantinha invisível nas nuvens , em sua estrutura mais alta e altitude muito maior que me mantinha com visual do mar (e da praia). Quando atingimos as proximidades da Terceira Ponte, perguntei ao meu copila Carneiro : alguma restrição para cruzar a ponte por baixo?

“não”. Foi a seca, simples, rápida e confiante resposta do Carneiro.

Cruzei a ponte pelo vão central a 50 pés , com visual das colunas do vão central em baixa velocidade (cerca de 40 nós) e pousamos com toda segurança na Escola de Aprendizes, que nos aguardava com a ambulância pronta. Nosso médico transferiu as informações sobre o paciente para o colega em terra , que na ambulância ligou a sirene e partiram para um hospital.

Missão cumprida... “borracha no ar”.... caminho da roça (por baixo ponte) .... raios e trovões da tempestade , assim como Netuno , comemorando o sucesso da missão, ofereceram condições de pouso a bordo na IDEPENDENCIA bem mais tranquilas que na decolagem.

De volta ao isolamento do meu camarote a bordo  pensei:

“ A Terceira Ponte pode se orgulhar de ter salvado, pelo menos, uma vida “



Esse é o CARNEIRO →→→

(meu fiel escudeiro)

Isso é HA-1

Isso é Aviação Naval

Isso é MARINHA !







                                             e isso , é um bando de 

                                                PIRATAS DO BEM














terça-feira, 26 de outubro de 2021

Pirata....e o Lorde COCHRANE

 


Amigos da Pirataria Alada

....meu cordial Bom dia.

Neste final de pandemia tenho vivido momentos de alegria. Uma delas , é ver que o meu amigo milicão carrancudo Comandante Barreira ,vem tendo o reconhecimento "literário", como um bom contador de histórias (ou "estórias " como alguns preferem ). Dessa forma ele me presenteou com um exemplar da, respeitada , RMB (Revista Marítima Brasileira ), que no   V.141 n°  07/09 julho/setembro 2021 , onde foi publicado na Pag 236 na coluna " Fatos Pitorescos da Vida Naval " o  seguinte artigo ( que me permito transcrever abaixo) em honra dos verdadeiros Piratas do Bem.





                Espírito de Lorde COCHRANE

    Em 1984 , como jovem capitão tenente já COA (comandante operativo da aeronave) de um Lynx SAH 11 do Primeiro Esquadrão de helicópteros de Esclarecimento e Ataque (HA-1) , navegava pela costa do Maranhão , a bordo da Fragata Constituição sob o comando do , então CMG Dumont. Acompanhada do CT Marcilio Dias , compúnhamos um GT brasileiro que faria parte de um exercício VENBRAS , junto a Marinha Venezuelana . Nos momentos de folga entre as atividades de preparação do DAE( Destacamento Aereo Embarcado) , composto pelo CT Wilson Rocha (meu amigo , mais antigo e chefe do DAE) e as praças de manutenção, me dediquei a leitura sobre o nosso primeiro Almirante brasileiro , o Lorde Cochrane.

Nesse momento de laser instrutivo, comecei a me identificar com algumas das características do nosso polêmico “lobo dos mares”, como alguns autores se referiam ao nosso Lorde marinheiro em questão.

Herói ou vilão? Essa era a questão que me vinha a mente a todo momento , enquanto progredia a minha leitura. Entre o turbilhão de episódios e títulos que acompanharam a vida daquele nauta, o título de “marques do Maranhão” me chamava atenção pela coincidência de estar naquele momento cruzando águas maranhense. Outra característica que marcou a vida de Cochrane foi sua associação as atividades de “pirata” ou “ corsário” atribuídas por vários historiadores. Sendo bom , ou mau , fato é que essas características sempre povoaram o imaginário de qualquer nauta, assim como eu , naquele momento incorporando a atividade profissional de um “nauta alado” em direção ao Mar do Caribe , famosa área de operação da “pirataria internacional”.

Atracamos em La Guaira, porto principal da Venezuela , sede da Marinha Venezuelana, onde encontramos os navios daquela Armada que formariam os GTs que participariam da Operação VENBRAS. Fomos ao Briefing da missão e soubemos que seria um exercício simples que visava apenas a cooperação entre nossas Forças buscando estreitar laços de amizade e cooperação mútua . Nosso Lynx a bordo da Constituição faria voos de esclarecimento em busca de uma fragata Venezuelana , acompanhada pelo nosso Marcilio Dias e caso os identificassem transmitiríamos a posição para um engajamento tipicamente naval entre os navios envolvidos.

Fiquei emocionado quando recebi a informação de que a área onde o exercício se desenvolveria incluía a “Isla la Tortuga”,famoso porto de reunião de piratas caribenhos. Eu estaria voando em busca de um inimigo fictício (pirata , ou não) para mostrar a superioridade da Marinha de Cochrane , séculos depois .


Os navios envolvidos se fizeram ao mar na área determinada para cada GT, cerca 100NM nordeste de La Guaira , na Região da Bacia La Cochila. Depois de alguns exercícios de passagem de carga leve o “freeplay” começou . Decolei para um plano de esclarecimento durante o dia em condições totalmente visuais . Sem encontrar sinais dos navios inimigos , resolvi tentar a sorte nas proximidades de uma ilha que despontava no horizonte. Os navios poderiam estar utilizando a ilha para com a proximidade estarem camuflando nosso radar de busca. Em 1984, nossos SAH 11, não tinham o modernismo tecnológico dos atuais WILDCATS de hoje. Constatei pela carta náutica (não havia GPS )que estávamos nos aproximando da famosa Isla la Tortuga. Agucei meu principal equipamento de busca , a visão. Busquei uma posição favorável evitando o reflexo dos raios solares na água do mar. Rodeamos toda a ilha e grande decepção: não havia nenhum navio de guerra escondido em suas margens , apenas um pequeno veleiro atracado num barranco. Frustrado resolvi não perder a oportunidade de sobrevoar a famosa , e desértica ilha . Qual não foi a nossa surpresa , minha e do copila Wilson Rocha (chefe do DAE) quando vimos um pequeno monomotor pousado numa área plana perto do veleiro atracado. constatamos que havia uma movimentação de caixas transportadas nos ombros por alguns homens entre o veleiro e o pequeno avião. Percebemos que ao ouvirem o barulho do helicóptero , houve uma desordenada correria dos homens largando as caixas.

“Bode Wilson” e eu nos entreolhamos e comentei pela fonia :

-“Acho que achamos alguma coisa irregular na “ilha dos Piratas” e não podemos fazer nada . Somos militares estrangeiros em terra estrangeira”

O Bode Wilson , como mais antigo e chefe do DAE decidiu.

-“Fragata Constituição ..Falcão 22 ... movimento suspeito entre veleiro e avião de pequeno porte na costa leste da isla la tortuga” ... solicito informar Marinha Venezuelana.... aguardamos instruções.”

-“Falcão 22 ... Constituição...mantenha observação e aguarde instruções”

A correia em terra era grande. Nos afastamos um pouco procurando sair do alcance de armas leves , como dava a entender que buscavam os envolvidos em terra. Depois de alguns minutos ouvimos no radio:

-“Falcão 22 ... Fragata Constituição....Helicóptero H1H venezuelano se aproximando da posição...exercício encerrado ....regressar ao navio mãe.”

Sem conhecer detalhes regressamos e pousamos na Constituição e nos dirigimos ao passadiço. As informações eram desencontradas. Adotamos a proa de Puerto la Cruz, balneário venezuelano na costa e terminal de abastecimento marítimo numa refinaria. Algumas horas depois se juntou a nós uma das fragatas Venezuelanas. Atracou ao nosso contrabordo e o comandante pediu para reunir os oficiais na Praça Darmas.

Entre brindes , contou o que havia ocorrido. Agradeceu a participação da Marinha do Brasil na apreensão pela Marinha da Venezuela de um grande carregamento de cocaína e nos convidou para comemorarmos o fato e o brilhantismo da Operação VENBRAS 84 num bar de Puerto la Cruz chamado Guatacarazo. Recomendou que fossemos fardados de “chiquinho”. Disse que era um hábito “pirata” da região , para impor respeito. Estranhamos , mas em nome do bom relacionamento internacional entre Marinhas, aquiescemos.

O comandante venezuelano tinha razão. No Guatacarazo fomos atendidos com pompa , respeito e muita alegre cortesia .Foi uma noite inesquecível de verdadeiros piratas do bem....nas “águas dos Piratas”, o Mar do Caribe.

Todas as vezes que recordo essa passagem naval me pergunto:

“seria esse o verdadeiro espírito de “Lorde Cochrane”...o primeiro Almirante da Marinha do Brasil ?


Assim foi publicado....e assim ocorreu.

Meu mais sincero e fraterno  abraço ao Bode Wilson assim como a todos Piratas da Confraria  organizada pelo Kavica e capitaneada pelo Nosso Pirata Mor Fredinho.

 














 

sexta-feira, 8 de outubro de 2021

Pirata....e os Canibais da Polinésia


 


Amigos da pirataria alada ....

 meu cordial ça va

 (como dizem os franceses) 




Nada como mexer em baús de tesouros guardados há muito, num dia chato de chuvinha fina que não para. Foi nessas condições que uma chave antiga que encontrei num canto do armário, me chamou atenção.
  Num primeiro momento olhei para a chave e senti que a conhecia... mas não me lembrava de quais dos segredos guardados aquela ferramenta poderia liberta-lo 

Forcei a mente e me lembre de um velho baú dos tempos de pirataria. Assoprei a poeira e fiz uso da velha chave. Ela funcionou perfeitamente e tive acesso aos segredos guardados. Muitas lembranças surgiram . Pequenos objetos garimpados pelo mundo e um amarrotado caderno de anotações me chamou a atenção e resolvi folheá-lo ao acaso. Parei numa página que tinha por título “ canibais da Polinésia”. Curioso , li e me surpreendi com as anotações que agora compartilho ;

O ano era 2009. A Nau Karima navegava em águas da Polinésia Francesa com destino ao Atol de Moruroa , no Arquipélago de Tuamotu. (um dos 5 arquipélagos que formam a Polinésia ).

O Atol de Moruroa foi palco de testes nucleares franceses entre 1966 e 1974 . Depois que os testes se encerraram a ilha foi interditada por décadas por receio das autoridades aos efeitos de radiação que a bomba produziria por anos.



No começo dos anos 2000 a interdição da ilha foi suspensa e o “caçador de peixes” (meu chefe) resolveu ir em busca de mais um recorde mundial naquelas águas . Por que logo ali ? Porque segundo ele , o local preservado por tanto tempo sem pescadores era onde os “grandes” peixes se desenvolveriam. Ele estava certíssimo ! Não só os grandes peixes , assim como toda vida marinha e vegetações típicas, se desenvolveram isoladas do contato humano. Conclusão : “não é a radiação nuclear que destrói o mundo. Quem faz isso ...é o ser humano “

Deixando a filosofia de lado e voltando as anotações, conheci um habitante local que entre um papo e outro , me falou sobre uma ilha “deserta” da Polinésia no Arquipélago das Marquesas no extremo noroeste. Isso era de grande interesse para o meu chefe “caçador de peixe” que logo foi informado e determinou nosso deslocamento imediato para a Ilha de Eiao.


Antes que iniciássemos o deslocamento , o meu interlocutor polinésio me alertou que a Ilha já fora habitada por “canibais” e que agora só eram vistas cabras pastando, mas...que tomasse cuidado se avistasse algum humano perambulando . Nunca se sabe , né? Vai qui ! disse ele.

Depois de uma navegação turbulenta, em águas pouco pacíficas do Pacífico, chegamos as cercanias de Eiao ( a ilha onde esqueceram das consoantes).


Resolvemos fazer um sobrevoo de reconhecimento com o Sea Baboon, por garantia. A ilha inóspita com muitas pedras grandes de vegetação escassa e rasteira, apropriada somente para cabras , que foram vistas em pequenos bandos. Observei do alto algumas formas quadradas , aparentemente de cimento e resolvemos (eu e meu chefe caçador de peixe) nos aproximarmos do solo e analisar os quadrados , semelhantes a hilipontos. Eram de fato de cimento com algumas pontas de ferro saindo da estrutura que indicavam serem resistentes ao peso de um helicóptero pequeno.  Nos sentindo seguros , o chefe me perguntou . “dá para pousar ? acho que dá, respondi....então tenta, disse ele. Me aproximei com cautela e testando “leve nos esquis” acabei pousando. Era seguro.

Cortei o motor e descemos ressabiados. O chefe saiu explorando o local e eu fiquei tomando conta do SeaBaboon . Vai que uma cabra resolve experimentar um pedaço dele.

Fiquei apreciando a linda paisagem daquele ponto alto da ilha onde havia pousado e pensando na “lenda dos canibais de Eiao” que havia pesquisado na noite anterior .

Diz a lenda que os franceses queriam fazer ali os testes nucleares que acabaram acontecendo em Moruroa nos anos 60 . Por que não fizeram em Eiao? Na verdade, não sei ... mas a lenda conta que quando os franceses desembarcaram na ilha , com material para construção das estruturas para os testes nucleares , encontraram uma sociedade de indivíduos isolados que sobreviviam praticando canibalismo. Os franceses , antes de saberem desse pequeno detalhe , desembarcaram trazendo na bagagem algumas cabras prenhas visando o abastecimento de leite durante o período de trabalho. Uma vez que as cabras se adaptassem as condições inóspitas da ilha.


Já os locais canibais, vendo a chegada de “carne fresca” aos seus domínios, representado  pelos ” braquelos “ europeus e seus bichinhos leiteiros, os receberam com simpatia e cordialidade, até que estivessem descansados , confortavelmente  instalados  e prontos para “o abate”. Na teoria dos locais, nessa situação “as carnes” estariam mais macias, sem a tensão natural de enfrentamentos.

Sem querer me estender em detalhes, diz a lenda que depois de se alimentarem de todos  os franceses, os canibais locais , se voltaram para o produto nacional , na falta de “importados”. A ingestão de produtos importados parece ter diminuído o apetite sexual dos naturais de Eiao, devido ao baixo teor de libido, característica do recém consumido “ alimento importado”. Por este motivo a reposição de estoque de alimento nacional diminuiu a ponto de sobrar apenas um cidadão humano em Eiao que acabou morrendo por desnutrição tornando-se alimento para as cabras que havia se reproduzido em grande quantidade, alimentando-se de qualquer vegetação rasteira entre as pedras e restos de antigos banquetes de humanos.


Se tudo isso é fato , ou lenda ... não posso afirmar ,mas que na ilha de Eiao só tem cabras e provas materiais de que humanos com conhecimento de “ concreto armado “ (talvez para fazerem testes nucleares) passaram por ali ... ah isso é verdade..

“Vamos embora ... nessa ilha só tem pedra, umas ruinas velhas e cabra... e uma delas ficou me encarando”.

Era o chefe que tinha voltado meio revoltado.

Vou pescar que é melhor .... ele completou.

Dei partida no SeaBaboon , dei uma olhada em volta e reparei num majestoso bode , que do alto da ilha numa pedra se impunha observando toda movimentação a distância , de focinho empinado sob um par de chifres imponentes como se estivesse dizendo:



Aqui em Eiao ... mando eu !!





Se quiser....Vai pescar



quarta-feira, 6 de outubro de 2021

Pirata....e a Confissão


 

Amigos da pirataria Alada ....meu cordial ...Olá


Hoje como um Pirata retirado das atividades aladas , me dediquei a atividade de adoração ao astro rei, na minha praia predileta , a de Santos. Peguei minha Beach Bag e fui para a praia do Boqueirão. Estiquei a cadeira e ouvindo um Rock and Roll no fone de ouvido ,me instalei na cadeira de praia. Não sei quanto tempo se passou quando senti uma sombra persistente que me incomodou. Abri um olho ( o bom) e me surpreendi. Era o Veterano :


“ que vida mansa ..heim Pirata!!?” disse ele com ar de irônico de desprezo pela minha atitude de vagabundo.

“ e você passeando na praia a essa hora ? ... vai trabalhar que o país já está cansado de vagabundagem “ .... repliquei imediatamente.

Rimos muito e ele se instalou ao meu lado. Abrimos uma Budweiser , brindamos e eu comecei a falar depois um belo gole:

“ Cara...acho que dei uma cochilada e sonhei . Sonhei que tinha passado no concurso para O Colégio de Pirataria da Enseada Batista das Neves em Angra dos Reis. Meu pai o Alado Pirata, já que era um aviador que navegava , as vezes num hidroavião Catalina, feliz me deu um “Fuscão “ de presente.

Aos 16 anos eu e meu Fuscão iniciamos a nossa aventura em Angra dos Reis em 1971. La chegando fiquei muito preocupado com o Colégio de Pirataria. O prédio era  isolado, quadrado , com uma única saída controlada. Seria um internato de 2 anos. Logo que chegamos , um Pirata instrutor oficial percebendo minha frustração se antecipou e disse : garoto !... pela sua cara você vai tentar fugir . Saiba que as fugas são incentivadas , afinal você está sendo preparado para ser pirata ! No entanto saiba que a fuga é válida ... desde que “Não Seja Pego durante a fuga... mas se for, a punição será exemplar. Faz parte do seu aprendizado”.

Naquele momento pensei :

 Eu vou fugir... e ninguém vai me pegar ! e a partir dali me dediquei ao planejamento.

Dediquei os primeiros 6 meses no Colégio a adaptação e observação. Nesse período , nos finais de semana , ia a cidade de Angra e lá conheci a parte divertida da Pirataria... O Farracho , era o “antro” noturno que juntava a juventude da pirataria a juventude das aprendizes de Sereias num mesmo ambiente movido a muito Rum. Percebi que para atingir o meu objetivo de “fuga sem ser pego” precisaria formar uma pequena gang do bem. Assim iniciei uma parceria com a aprendiz de Sereia , conhecida na área como Flor. Firmei amizade com um colega do Colégio , o Paul Pilot, que acabou se tornando meu parceiro de toda vida. A logística para o plano de fuga já estava montada. Agora precisaria encontrar uma forma de sair do prédio quadrado, com uma única saída policiada, sem levantar suspeita. Conseguindo isso teria acesso ao meu Fuscão que estaria estacionado na avenida em frente ao Colégio , que era de tráfego público.

Percebi que fora do quadrilato policiado havia um instalação chamada de “Grêmio Cultural”. Nele havia uma pequena sala, destinada a confecção de uma revista chamada “ A FRAGATA”, e   um jornalzinho chamado “ GINGILIN”. Essas publicações era dirigidas por um aprendiz de pirata do segundo ano , portanto meu veterano. Isso seria um problema se esse veterano não fosse um conterrâneo paulista da terra dos Bandeirantes , como eu, o  Favi. Isso ajudou muito na aproximação para que, usando a minha pouca capacidade de desenhar, me candidatasse como “desenhista" do jornal GINGILIN. Após um rápido teste , fui aceito e assim me tornei o desenhista oficial do Jornal GINGILIN, e mais importante que isso, adquiri o direito de sair do quadrilato policiado a qualquer hora ...para trabalhar no “jornal quinzenal” do Colégio de Pirataria. Agora como “artista” adotei o pseudônimo BARREIRA para assinar minhas obras artísticas. Criei o personagem que encarnava o pirata aprendiz “Zi”.

 Mesmo com a censura da época , o Zi , era um piratinha “cabeludo” (Como deveria ser . Talvez por isso não tenha sido censurado em 1971. Vai saber). Era tudo que precisava para ter acesso ao Fuscão.                                  


Realizei a minha primeira fuga teste já no final do ano quando já era reconhecido por todos como “Barreira o desenhista do GINGILIM 71”. O resultado do  teste foi perfeito, o que me incentivou a diversificação de novos métodos seguros de fuga . Meu amigo Paul Pilot , me dava cobertura interna em qualquer necessidade e a Sereia aprendiz Flor de Campos , me dava apoio logístico externo.

No curso curricular tudo correu bem com uma pequena dificuldade na matéria do Idioma Britânico, porque afinal , pirata que é pirata , tem que se comunicar em inglês. Eu e o Paul sofremos um pouco, mas no fim tudo deu certo , passamos para o segundo ano.

No segundo ano , agora como pirata aluno veterano , continuei com minha atividade artística , Barreira, o desenhista .Me tornei Diretor da revista “A FRAGATA” ( o que me ajudou ainda mais a justificar minha permanência fora do quadrilato policiado).  Descobri que participar da equipe de Voleibol me daria novas oportunidades de fuga. Tínhamos jogos em outras cidades e isso facilitou fugas nos finais de semana. O Paul Pilot , que era da equipe de Basquetebol me acompanhava em alguma empreitadas. O ano de 1972 passou rápido depois de algumas emoções em fugas não muito bem planejadas , que foram superadas com ajuda do inseparável Paul Pilot. Depois de vários volumes de “GINGILIM 72 “ e da impressão da FRAGATA, nos formamos no Colégio de Piratas , sendo promovidos a Aspirantes da Academia de Piratas de Villegagnon , no Rio de Janeiro .

O problema aumentou quanto as fugas . deixamos um quadrilato fechado para uma ILHA , com uma única saída por uma ponte vigiada. Voltaríamos a ser calouros , o que seria mais um problema. Tive que me concentrar para desenvolver novas técnicas de fugas seguras.

Aproveitando as experiências vitoriosas do Colégio , e considerando que na academia também existia uma revista “ A GALERA “ e um jornalzinho “ Villegagnon “ , me candidatei e fui aceito pelo meu “curriculum” .


Mantive o pseudônimo BARREIRA. Só tinha um problema : a redação desses novos periódicos continuavam na ILHA ... com uma única saída por terra. Não seria mais um bom argumento para fuga da ILHA. O FUSCÃO , que me acompanhou, agora ficava estacionado numa das bordas da ILHA, sofrendo com a maresia das águas salinas que quebravam nas pedras próximas. Nós chamávamos o local de estacionamento de “Paiol de Ferrugem “ . Era um lugar isolado , longe das vistas do “policiamento”. Isso despertou o meu interesse , e assim passei a estudá-lo.

Cheguei a conclusão que a melhor forma de sair da ilha , seria pela via marítima. Para tal havia duas formas : ou nadando , ou navegando. A primeira foi descartada porque eu sabia nadar, mas não era nenhum “tubarão”. A outra forma seria navegando e para isso precisaria de uma embarcação. Me candidatei para a equipe de Vela. Nunca havia velejado na vida . Como calouro fui aceito inicialmente , para “lavar” barcos. Seria um planejamento a longo prazo.

Enquanto o plano de fuga marítima se desenvolvia lentamente , me dediquei a opção terrestre. Conclui que o Fuscão desempenharia um papel fundamental. Eu teria que sair no porta -malas  mas de um FUSCA ? Seria impossível ! Não era ! . Nos meus momentos de folga eu , e meu biótipo magro e flexível , desenvolvemos um método de contorcionismo que depois de algum tempo provou ser eficaz . O método já estava desenvolvido : “porta-Malas “. Agora só faltava um , “condutor autorizado”. Como encontraria essa peça-chave do plano , que fosse confiável o suficiente e corajoso para aderir ao meu, arriscado, plano .

 


“Não Seja Pego durante a fuga... mas se for, a punição será exemplar. Faz parte do seu aprendizado”. ...essa frase dita no meu primeiro dia de Pirataria , não saía do meu pensamento.

Comecei a perceber que alguns Aspirantes a Pirata , quando iam para consulta medica na enfermaria da ILHA, dependendo da gravidade da enfermidade, recebiam um papeleta, assinada por um médico, que autorizava o jovem Aspirante a se dirigir ao Hospital Central da Pirataria , no Centro do Rio de Janeiro , próximo ao cais do Porto , como convinha a qualquer Pirata. Aí estava a solução do meu problema!!! Só precisava um Aspirante enfermo autorizado que soubesse dirigir e disposto a se arriscar na aventura.

O primeiro teste ocorreu com o Aspirante cearense Little Baku. Tudo ocorreu bem e consegui a minha primeira fuga vitoriosa da ILHA. O método ainda necessitava de ajustes , como o local de desembarque do porta-malas , sem levantar suspeita. Esse problema foi resolvido por uma determinada vaga coberta pela folhagem de um ”chorão” do estacionamento do MAN (Museu de Arte Moderna )  do Rio de Janeiro , no aterro do Flamengo.

Tudo mudou , quando jogando voleibol no horário de recreação, torci o tornozelo e fui levado para Enfermaria da ILHA. Fui atendido por um oficial pirata medico Dr Paul Nielsen, ortopedista. Ele me analisou e chegou a conclusão que eu necessitaria de uma radiografia no Hospital Central. Pegou um bloco de papel , preencheu umas palavras , estampou um carimbo com seu nome e assinou por cima “Paul Nielsen”, puxou o canhoto e me entregou. Ele não entendeu porque sorri , mesmo sentindo a dor lancinante da torção.  O Dr deixou o bloco numa prateleira repleta de blocos iguais e foi buscar alguns analgésicos na sala ao lado. Foi o tempo suficiente para eu me apossar de um bloco como “souvenir”. Não faria falta para o Doutor Pirata Paul, mas poderia resolver o “problema” de vários Aspirantes Piratas isolados naquela ILHA.

A partir desse dia eu iniciava um novo plano de fuga. O ano de 1973 já havia passado . Em 1974 eu já era um Aspirante Pirata do segundo ano (não era mais calouro). Já começava a velejar em barcos Soling numa tripulação de 3. Paul Pilot e Lis das Montanhas, eram os outros Aspirantes piratas da tripulação e do camarote na ILHA que era completo pelo Aspirante Pirata Lui Guava. Enquanto aprimorava a minha capacidade de navegar saído da Ilha , muitas vezes em direção ao Iate Clube do Rio de Janeiro (afinal ali seriam disputadas as regatas da classe Soling ). Muitas vezes tínhamos que atracar no Iate Clube para....”descansar” e abastecer o barco ....de vento, antes de retornarmos para a ILHA.

Nessa época passei a ter a importante companhia da aprendiz de Sereia Alic Mary, filha de um grande Pirata que comandou a “ Capitânia NAU Tamandaré” em 1972,  meu aparentado no qual me inspirei para adotar o pseudônimo Barreira. Em função dessa aproximação fui incentivado a aprimorar minhas técnicas de fuga. Agora tinha mais um fator motivador

Enquanto produzia o Jornal “Villegagnon” da ILHA , treinava minha habilidade artística desenhando o personagem “KATRAKA”... um pirata atrapalhado , e ao mesmo tempo tentava produzir uma assinatura semelhante com o nome “ Paul Nielsen”. Fui premiado pela perseverança e finalmente consegui produzir uma assinatura perfeita , que eu executava com mais facilidade do que , a minha própria assinatura. Era um crime , mas que seria usado apenas para boas causas , como é de praxe na Pirataria do Bem para a qual eu estava sendo formado.  Dando sequencia ao plano ... mandei confeccionar um carimbo no comercio com as mesmas características do carimbo que constava na minha papeleta de licença medica . O carimbo ficou perfeito e primeiro teste foi aprovado . Saí da ILHA dirigindo o meu FUSCÃO com uma licença medica assinada pelo Dr Paul Nielsen , confeccionada por mim mesmo. Ponto para minha fuga perfeita,

Eu não podia abusar do sucesso. Se fizesse isso , em algum momento , a fiscalização da ILHA desconfiaria da minha condição sanitária. Assim dividi meu plano com parte da comunidade de Aspirantes Piratas . Promovi audiências particulares para avaliar a real necessidade de usar a minha “Licença Medica assinada pelo Dr Paul”. Em caso de necessidade , eu pegava carona no porta-malas do meu carro , de algum dos aprovados nas minhas audiências particulares que serviam de motoristas.

Em 1975, tudo corria bem nas minhas fugas. No terceiro ano da Academia , já éramos veteranos. Eu já sabia velejar , assim como os amigos Paul e Lis . Assumimos comandos de Soling e disputávamos regatas, mas ainda podia melhorar. As fugas ocorriam com tranquilidade , quando necessárias, mas tínhamos que ficar atentos as outras matérias . Afinal todo bom Pirata tem que ter conhecimentos variados do Tipo “Engenharia Mecânica”. Matéria como mecânica dos fluidos , resistência de materiais, cálculo exigiam , as vezes , mais que ... fugas. Tudo bem,  ... as vezes a gente treinava um pouco “fuga” para comprar um sanduiche de atum e uma  coca cola, fora da ILHA, para ajudar no estudo de outras matérias.

Chegou 1976. O último ano na ILHA e fase final do nosso aprendizado. As fugas tornaram-se desnecessárias (troquei o FUSCA por um BUG). Como quarto anistas , éramos “donos” da ILHA . O internato passou a ser flexível para nós. Eu já me considerava formado em “FUGAS”. Só usaria meus conhecimentos adquiridos nessa matéria em caso de necessidade real , durante a vida de Pirata Profissional.

Nosso instrutor de “vela” , um Pirata Fuzileiro (Tio Bio ), muito amigo de uma família Viking que habitava o outro lado da Bahia de Guanabara, conseguiu que esses Vikings aceitassem nos treinar na arte de velejar e assim nosso barco “ITAIPU “ foi transferido para Niterói. Isso facilitou o nosso distanciamento da ILHA. Íamos treinar com os melhores do mundo na arte de velejar .... os Vikings Smith & Grael. Isso acabou resultando num 5° lugar no Campeonato Brasileiro e uma vitória na 7° regata do Campeonato Sul-Americano de Soling. Resultados , muito acima do esperado, para um pirata que aprendeu a velejar apenas para executar “fugas” de uma ILHA.

O ano terminou com a nossa formatura. Recebemos nossa espada de Pirata. O diploma que não deixa duvidas sobre nossa capacidade de fazer TUDO ,... até NADA ( se for necessário).

A revista “A GALERA” foi impressa e distribuída no tempo certo. Tivemos um Baile de Formatura onde participei da organização.  Nos apresentamos na NAU Custodio de Mello para uma viagem de instrução de 9 meses pelo mundo. Colocamos em pratica nossos conhecimentos de navegação astronômica e fomos apresentados ao mundo como “ os novos Piratas Brasileiros “. Em 1977 a pirataria internacional deu Boas-vindas , à COMUNIDADE.

No regresso empunhei minha espada e me uni a Sereia Alic Mary para começar uma vida exótica de Pirata Amazônico. Foi um experiência única. Conheci piratas de todas as formas existentes . Desde Bons até Maus piratas.

1979 o ano que mudou a vida do Pirata. Nasceu o primeiro descendente Piratinha Denis o Travesso, e iniciou a formação daquilo que me tornei : “ O PIRATA ALADO “

Em 1980 recebi as asas de fato e comecei a voar pelo mundo. Conheci e me aliei a grandes piratas Alados do bem . Pirata Lima Boleiro Laranjeiras e Pirata Barba Russo. Aprendi tudo com esses caras , principalmente na “Caverna do Lince” , para onde fui enviado pelas Autoridades da Pirataria. Tive oportunidade de pôr em pratica tudo que aprendi na Academia e na Escola de Alados. Foram anos intensos.


Em 1983, outra grande alegria. A Sereiazinha Danica  embelezou a vida do Pirata Alado e da sereia Alic Mary, formando um par perfeito com Piratinha Denis o Travesso. Acabamos todos transferidos para França onde vivemos novas experiências, que marcaram nossas vidas.

Em 1989 , já de volta ao Brasil, foi quando as coisas começaram acontecer e que me obrigaram a fazer a “Confissão do Pirata “. 

Comecei a ouvir vozes ao longe que diziam “ .... é a última volta ....AL UNSER bateu no muro .... está fora prova .... EMERSON FITTIPALDI... é o Campeão das 500 Milhas de INDIANAPOLIS!!!”.

Gosto de corridas de carro e fiquei feliz ao ouvir esse anúncio. Tentei abrir os olhos para ver de onde vinham as vozes ... e senti um certo desconforto. Percebi que apenas meu olho esquerdo percebeu uma certa claridade através de uma fresta . O olho direito continuava no breu. Tive uma sensação ruim e tentei me levantar. Senti muita dificuldade e senti dor em várias partes com o esforço. Tentei falar e percebi que minha boca estava tampada por algo que parecia um pano. Eu não estava entendendo nada do que estava acontecendo. Me esforcei mais ainda e mesmo com dor consegui ficar de pé , meio tonto. Pela fresta do olho esquerdo , percebi que estava num quarto de Hospital e uma televisão estava ligada. Não conseguia imaginar como havia chegado naquele local. Consegui ´perceber que meu braço esquerdo estava todo enfaixado assim como a minha cabeça. Meus movimentos eram restritos. Identifiquei uma porta de banheiro e me esforcei em atingi-la , no que tive sucesso me apoiando nas paredes. Ao entrar no banheiro me deparei com um espelho que mostrava uma múmia apoiada no batente da porta. Levei um susto. Minha cabeça começou a rodar e conclui que a Múmia ... era eu !!! .

Alguém entrou no quarto e me segurou delicadamente dizendo : “vem pra cama e deita” . Era a Sereia Alic , minha companheira de vários anos , mãe do meu casal de filhotes. Apoiado por ela me deitei novamente. Consegui balbuciar alguma coisa por entre a bandagem que cobria a minha boca perguntando o que havia acontecido.

“ Você teve um acidente de carro, atropelou uma vaca na estrada e estava em coma induzido pelos médicos” ... Alic me respondeu com sua calma habitual.

“Onde estou ?” ... perguntei

Nisso entrou uma enfermeira que respondeu.

 “ Você está em São Paulo , num dos melhores hospitais referencia de traumas ortopédicos, fique tranquilo “.

Minha cabeça entrou em pânico . “como eu iria pagar um hospital desses ? não tinha plano de saúde e nem dinheiro para bancar esse estrago todo “!

Aos poucos Alic foi me esclarecendo , com calma o ocorrido  percebendo minha aflição.

Eu havia atropelado uma vaca preta numa estrada vicinal do interior de são Paulo próximo a Sorocaba, durante a noite. A vaca entrou pelo para brisa , da minha Parati recém adquirida no regresso da França. Eu perdi o controle do carro e capotei para fora do barranco e fui socorrido pelo caminhoneiro que vinha no sentido contrário e presenciou o acidente. Fui levado para um pronto socorro de Sorocaba . A enfermeira que atendeu no pronto socorro, encontrou  a minha identidade de Pirata profissional e ligou para o marido que era um Pirata Subalterno que servia num projeto, confidencial ,que se desenvolvia num centro Tecnológico da pirataria Naval, próximo a Sorocaba. La , a Pitaria desenvolvia um Submarino de propulsão nuclear, daí ser um projeto “meio secreto” da pirataria Naval. O marido da enfermeira imaginou que fosse um Pirata do centro tecnológico e ligou para o seu Diretor . Esse Diretor , preocupado , providenciou a minha remoção do pronto socorro para um Hospital de Referencia, em São Paulo, dada a gravidade da minha situação. Os custos iriam ser cobertos com verba especifica do projeto, “meio secreto” para esses casos emergenciais , já que não existia na área, Hospital especifico da Pirataria Naval.

 Fiquei um pouco mais tranquilo, mas não muito. Não era justo eu ficar ali. Queria ir para o meu habitat natural, o Hospital do pirata Marcilio Dias , no Rio de Janeiro.

No dia seguinte. fui visitado pelo Diretor do Centro Tecnológico que me acolheu. Agradeci e explicitei minha vontade de ser transferido para o Hospital da pirataria no Rio. Ele entendeu as razoes da minha vontade e disse , que eu seria transferido assim que tivesse condições medicas para tal.

Fiquei sabendo também que meu amigo Pirata Alado Barba Russo teve participação ativa na comunicação do ocorrido e providencias necessárias ao encontro da Sereia Alic Mary com a múmia piratesca, em que eu tinha me tornado.

Eu não me lembrava de absolutamente nada que envolvia o acidente , e não lembro até hoje , por mais esforço que tenha feito.

Uma semana depois daquele 28 de maio de 1989 , ( data da primeira vitória de Emerson Fittipaldi nas 500 Milhas de Indianapolis ), fui autorizado a me internar no Hospital do Pirata Marcilio Dias, no Rio de Janeiro. Antes , ainda em São Paulo , perguntei a um medico ortopedista “figurão”, sobre minhas possibilidades de voltar a voar , já que minha mão esquerda tinha sido “moída” pelo impacto da vaca na  mão esquerda que segurava com firmeza o volante na hora. A resposta foi:

 “ pode tirar o cavalinho da chuva porque você perdeu a movimentação do punho esquerdo, voar ... nunca mais”.

Fiquei muito triste e tentei me consolar : Pirata continuarei sendo ... agora ... sem asas.

No Marcilio Dias fiquei sabendo que minha mão esquerda sofreria uma operação ortopédica, para tentar reposicionar os ossículos pretendendo me proporcionar um mínimo de movimentação do punho. Fiquei feliz com a notícia . Não tirei “os cavalinhos da chuva “ como o “figurão” medico paulista me recomendou. Criei esperança na capacidade da medicina piratesca.

Chegou o dia da Operação. Fui todo devidamente preparado ,  por toda uma equipe cirúrgica e alertado pelo anestesista já com a agulha na mão que eu seria anestesiado geral e que não sentiria nada. Quando ele se preparava para aplicar a anestesia , entra na sala ... ele ... o cirurgião que ia arrumar os meus ossos da mão. Fiquei pasmo !!! e gritei “PARA TUDO”,😲

Era o Dr Paul Nielsen.

“Tenho que me confessar !!” ... disse em tom autoritário na sala de cirurgia. A equipe atônita sem entender nada não se moveu,

“ preciso de uma caneta ou lápis rápido para fazer uma confissão”

Não sei como , uma caneta e um pedaço de papel apareceram rapidamente na minha mão direita , sem problema . Me posicionei de forma a apoiar o papel e executei a minha ,

 “ Confissão do Pirata “.

Assinei com propriedade a minha velha conhecida assinatura : “ Paul Nielsen “

Mostrei o papel para o atônito Doutor. A sala sem entender ficou muda.

Me deitei e autorizei o anestesista a executar o seu trabalho . Olhei para o Doutor Pirata Paul Nielsen e disse :

“Se eu voltar da anestesia contarei toda história dessa confissão , mas saiba que estou agradecido por tudo que o senhor já fez e ainda fará por mim. Agora pode operar tranquilo , eu estou muito mais tranquilo ,  confiante e aliviado”.

A operação se realizou, eu voltei a vida quando a anestesia passou  . Contei toda história da minha CONFISSÃO para o Dr Paul. Rimos muito , afinal pirata ... é pirata.  Uma semana depois obtive alta. Fui transferido para o Centro de Instrução  de Pirataria Alada em São Pedro da Aldeia. Seria o encarregado da formação dos novos Piratas Alados . Conheci a fisioterapeuta Maria Pirata que me colocou num  duro tratamento intensivo. 3 meses depois com algum movimento na mão consegui me requalificar na Toca dos Linces. Voltei a voar e não precisei “tirar os cavalinhos da chuva”.

9 anos mais tarde fui nomeado Comandante dos LINCES  Alados... e hoje perdi as contas de quanto já voei .....sem NUNCA ter sido pego nas minhas FUGAS,,,,,.e aí ACORDEI do sonho"

 😂😂😂😎😎😱😱😍😍😍😍😍

Quando parei de falar , percebi que já estava escuro .. e do nosso lado , jaziam várias garrafas de Budweiser,,,,vazias.... na praia... e o VETERANO me disse :

“ Pô... Pirata... vou publicar essa história “

Não precisa não, eu já publiquei no meu Blog “ Aventuras do Pirata Alado”

 


HOMENAGEM  à alguns Piratas Alados que de alguma forma ajudaram a construir essa "estória"